31/05/2006

Artigo meu no Mídia Sem Máscara

Saiu hoje (31/05/2006) um artigo meu no sítio do Mídia Sem Máscara intitulado "Versão televisiva da compaixão". Seu link é http://www.midiasemmascara.com.br/artigo.php?sid=4925 .

25/05/2006

Para entender o Brasil de hoje

Se alguém quer entender o que se passa no Brasil hoje, ou seja, o que é a mistura entre PT e PCC, para de ler Folha de São Paulo e cia. e pare, sobretudo de assistir ao Jornal Nacional.

Leia, por exemplo, o artigo transcrito abaixo, do professor e filósofo Olavo de Carvalho. Seja paciente e humilde. O assunto é complexo. Não procure soluções simples para assunto tão complicado. Se algo no que está escrito lhe causar desconforto, continue lendo e depois analise mais atentamente o desconforto. Ele é provavelmente devido a duas visões de mundo conflitantes. Uma é aquela que você vê na telinha da Globo e nas páginas da Folha. A outra é a real, que é descrita no artigo.

Se você acha isso um exagero, dê uma olhadinha no sítio do
Mídia Sem Máscara. Acompanhe por alguns dias o sítio e você terá uma nova visão da realidade. Será como um cego que teve sua visãqo de volta. Faça o experimento, com muita humildade e paciência e boa sorte.

Segue o artigo.

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Experimento sociológico

Olavo de Carvalho em 24 de maio de 2006

Resumo: Quando pregam a doutrina de que a pobreza produz o crime, os cientistas sociais não estão cometendo um inocente erro de diagnóstico. Estão ocultando, com maior ou menor consciência, a colaboração ativa que eles próprios, por meio dessa mesma doutrina, dão ao crescimento irrefreado da criminalidade.


A maioria dos cientistas sociais não se dedica a outra coisa senão a explicar os acontecimentos como efeitos de "causas" impessoais e anônimas, como por exemplo a "luta de classes" (com todas as variações aí introduzidas pela moda e pelas conveniências táticas), escamoteando a ação concreta dos indivíduos e grupos que dirigem o processo. Tudo aí parece derivar de estruturas, de leis, de estatísticas, reduzindo-se os agentes reais a meros instrumentos, quase sempre inconscientes, de forças coletivas que os transcendem imensuravelmente. A principal utilidade dessa construção fantasiosa é encobrir sob um manto de invisibilidade a força dos próprios cientistas sociais enquanto "agentes de transformação", bem como a dos grupos e entidades que lhes dão sustentação editorial e financeira.

Os exemplos sucedem-se a cada semana, mas tornam-se mais enfáticos nos momentos de confusão e pânico, quando essas criaturas das trevas emergem de seus sepulcros acadêmicos para vir explicar ao mundo que não há nada de novo sob o Sol, que está tudo sob o controle infalível da ciência que professam. Assim, diante do estado insurrecional triunfante produzido em São Paulo por uma iniciativa estratégica bem articulada entre o governo brasileiro e três organizações milionárias, PCC, MST e FARC, o sociólogo francês Loïc Wacquant, professor da Universidade da Califórnia em Berkeley, foi convocado às pressas pela Folha de S. Paulo do dia 15 para acusar os culpados de sempre e ajudar as vítimas a não enxergar os agentes efetivos por trás do processo.

A principal glória curricular do prof. Wacquant é ser autor de dois livros que explicam a criminalidade como efeito da guerra dos ricos contra os pobrezinhos e ter recebido, em função de suas obras, um prêmio da paupérrima John D. & Catherine T. MacArthur Foundation, badalado como "o prêmio dos gênios".

Felizmente, a ciência social às vezes nos fornece o antídoto à sua própria vigarice. No caso, o antídoto é o "experimento imaginário" sugerido por Max Weber para comparar a importância relativa de vários fatores causais numa dada situação. Trata-se de fazer abstração mental de determinado fator e averiguar se, sem ele, os acontecimentos teriam sido possíveis. Suponhamos a miséria e a desigualdade. Elas estão presentes por igual em sociedades assoladas pela violência criminosa e entre povos mais pacíficos como os indianos e os romenos. Mutatis mutandis , a criminalidade no Brasil não se expandiu nas áreas mais pobres, mas justamente naquelas que, ao longo das últimas décadas, passaram da miséria absoluta a um padrão de vida que, na Índia, seria considerado de classe média, como por exemplo as favelas cariocas. Omitida a comparação, porém, restam dentro de cada área isolada sinais aparentes em quantidade bastante para manter viva a impressão de que o crime é efeito da miséria. Acoplada a outro topos da retórica esquerdista, o de que a miséria é causada pelo imperialismo americano, essa crença tem por efeito despertar o ódio aos EUA e fomentar esperanças messiânicas numa nova ordem internacional paradisíaca, a ser instaurada sob os auspícios da ONU, da China e da Rússia. Para a realização desse objetivo trabalham incansavelmente várias fundações bilionárias, entre as quais Rockefeller, Carnegie, Soros e, é claro, MacArthur. Seus esforços nesse sentido já foram bem documentados meio século atrás por uma comissão do Congresso americano (v. René A. Wormser, Foundations: Their Power and Influence , New York, Devin-Adair, 1958) e desde então não fizeram senão multiplicar-se em abrangência e quantidade de recursos, incluindo dotações de dinheiro do próprio governo de Washington, que essas entidades sugam e utilizam para seus próprios fins (de modo que esse governo acaba aparecendo como o culpado do que fazem contra ele). Premiar uns quantos "gênios" que ajudem a revestir de honorabilidade científica a trapaça essencial em que se assenta a operação é a parte menos dispendiosa do orçamento. O grosso do dinheiro vai para fomentar diretamente movimentos subversivos e organizações pró-terroristas (v. a estrutura da rede em http://www.discoverthenetwork.com/ ).
Se, de acordo com o experimento weberiano, abstrairmos do quadro presente a atuação dessas fundações, o resultado será simplesmente que a esquerda revolucionária do Terceiro Mundo não teria podido continuar a existir e prosperar depois da queda da URSS e, portanto, a utilização do crime como instrumento da subversão organizada, que é o seu principal modus operandi na última década, se tornaria inviável.

O banditismo, assim, cresceu junto com o prestígio oficial da tese mesma que o explica pela luta de classes. Alegando razões fundadas nessa teoria, o prof. Wacquant prevê um aumento da violência no Brasil. Mas essas razões são desnecessárias. A violência crescerá junto com o número de idiotas que acreditam no prof. Wacquant.

Se os praticantes da ciência wacquântica fossem sérios, estudariam um pouco de lógica da investigação científica e saberiam que nenhuma correlação causal (entre pobreza e crime ou entre qualquer coisa e qualquer outra) pode ser generalizada para um grupo abrangente de casos sem que esteja muito bem provada ao menos em alguns deles individualmente. Ora, na escala individual a pobreza só pode ser justificação direta e determinante do crime em exemplos excepcionais e raros – tão excepcionais e raros, na verdade, que em todo país civilizado a lei os isenta da qualificação mesma de crimes. São os chamados "crimes famélicos" – o desnutrido que rouba um frango, ou o pai sem tostão que furta um remédio para dar ao filho doente. Em todos os demais casos, a pobreza, se está presente, é um elemento motivacional que, para produzir o crime, tem de se combinar com uma multidão de outros, de ordem cultural e psicológica, entre os quais, é claro, a persuasão pessoal de que delinqüir é a coisa mais vantajosa a fazer nas circunstâncias dadas. Quando o hábito da delinqüência se espalha rapidamente numa ampla faixa populacional, é claro que, antes dele, essa persuasão se tornou crença geral nesse meio, reforçando-se à medida que as vantagens esperadas eram confirmadas pela experiência e pelo falatório. Ora, é de conhecimento público que, entre a mesma população pobre, por exemplo das favelas cariocas ou da periferia paulistana, duas crenças opostas se disseminaram concorrentemente nas últimas três décadas: de um lado, o apelo do crime; de outro, a fé evangélica. Numa população uniformemente pobre, o número de evangélicos praticantes que delinqüem é irrisório. Basta esse fato para provar que a correlação entre pobreza e crime é uma fraude, um sofisma estatístico da espécie mais intoleravelmente suína que se pode imaginar. Nenhuma ação humana é determinada diretamente pela situação econômica, mas pela interpretação que o agente faz dela, interpretação que depende de crenças e valores. Estes, por sua vez, vêm da cultura em torno, cujos agentes criadores pertencem maciçamente à camada letrada, como por exemplo os bispos evangélicos e os cientistas sociais. Os bispos ensinam que, mesmo para o pobre, o crime é um pecado. Os cientistas sociais, que os criminosos, agindo em razão da pobreza, são sempre menos condenáveis do que os ricos e capitalistas que (também por uma correlação geral mágica) criaram a pobreza e são por isso os verdadeiros culpados de todos os crimes. Essas duas crenças disputam a alma da população pobre. Não é preciso dizer qual delas estimula à vida honesta, qual à prática do crime. Nos bairros mais miseráveis e desassistidos, qualquer um pode fazer esta observação direta e simples: as pessoas de bem repetem o discurso dos bispos, os meliantes o dos cientistas sociais (do sr. Marcola nem preciso dizer nada, já que ele próprio é meio cientista social). Quando, do alto das cátedras, esses senhores pregam a doutrina de que a pobreza produz o crime, não estão cometendo um inocente erro de diagnóstico. Estão ocultando, com maior ou menor consciência, a colaboração ativa que eles próprios, por meio dessa mesma doutrina, dão ao crescimento irrefreado da criminalidade. E, quando são premiados por uma organização ostensivamente interessada em disseminar a subversão, como é o caso notório da Fundação MacArthur, eu seria o último a negar que mereceram o prêmio.

Se, deixando de lado as generalizações etéreas, nos atemos à seqüência real dos fatos, a ordem temporal de produção dos acontecimentos da semana passada aparece com o seguinte desenho:

1 - Desde a década de 30, atendendo a uma ordem de Stalin, a intelectualidade esquerdista mundial, onde há mais cientistas sociais per capita do que lobos numa alcatéia, se dedicou ativamente a infundir em todas as patologias sociais, como o crime e o racismo, a substância universalmente explicativa da luta de classes. O esforço dos teóricos foi aí secundado por uma multidão inumerável de romances, filmes, peças de teatro e canções populares que faziam a idéia penetrar profundamente no imaginário popular ao ponto de se tornar um dogma inabalável. Nos países do Terceiro Mundo, justamente graças à profusão de patologias sociais existentes, essa doutrina se impregnou com aderência maior ainda, tornando-se o tema dominante, senão único, de várias culturas nacionais, entre as quais a brasileira (dediquei a esse tema uma série de artigos publicados em 1994 sob o título "Bandidos e letrados").

2 - Quando o ambiente cultural estava suficientemente preparado, a transformação do banditismo em instrumento da luta de classes revolucionária passou da teoria à prática. No Brasil, especialmente, o empenho organizado dos militantes de esquerda para arregimentar a serviço da subversão as gangues de delinqüentes já é um fato abundantemente documentado desde a década de 60. Da esquerda o banditismo absorveu não somente a doutrina e o discurso, mas também as técnicas de guerrilha urbana que empregou, por exemplo, no movimento insurrecional da semana passada. O contato entre as gangues e os grupos terroristas intensificou-se ao ponto de tornar-se institucional. A presença de técnicos das FARC e das organizações terroristas islâmicas em vários grupos criminosos do Brasil já se tornou tão freqüente que não suscita mais nenhuma reação de escândalo. Acostumamo-nos a isso como a um dado da natureza.

3 - Quando a esquerda latino-americana, em 1990, passou por um formidável upgrade com a fundação do Foro de São Paulo, as organizações de narcotraficantes, seqüestradores e assaltantes acompanharam-na na sua ascensão social, assentando-se ao lado de partidos legais como o PT e o PC do B nas assembléias do Foro, coordenação estratégica do movimento comunista latino-americano. Desde então, todo empreendimento subversivo de larga escala, no continente, é realizado sob a supervisão ao menos indireta do Foro de São Paulo. Não há mais iniciativas isoladas: o banditismo avulso vai sendo sepultado na memória coletiva como um resíduo de eras extintas. Por toda a parte o que se vê é integração, conexão, unidade ideológica e estratégica.

4 - Como fundador e principal líder do Foro de São Paulo, o sr. Luiz Inácio Lula da Silva sempre esteve muito bem informado do grau de organização que seus colegas de militância haviam conseguido transmitir aos grupos de delinqüentes, nas cadeias ou fora delas. Mais informado ainda encontrava-se esse cidadão pelo fato de ser presidente da República, tendo sob seu serviço direto os órgãos de inteligência e a Polícia Federal, além, é claro, da figura insubstituível do seu ministro da Justiça, cuja convivência íntima com os líderes maiores do banditismo nacional tem representado, para ele, mais que um estilo de vida, um meio de próspera subsistência.

5 - Em vista disso, é absolutamente impossível que essas duas excelências ignorassem a preparação do mais vasto movimento insurrecional já planejado neste país no último meio século, e que, portanto, fosse com cândida inocência e desconhecimento das conseqüências que a primeira autorizou e a segunda pôs em prática o indulto que colocou na rua, livres, armados e bem articulados, doze mil delinqüentes, entre os quais os autores da carnificina.

6 - Mais impossível ainda é que os excelentíssimos ignorassem o detalhe mais lindamente perverso da situação que geraram. Todo mundo sabe que, neste país, os policiais recebem uma quantidade irrisória de munições, tendo de dispender do próprio bolso para garantir-se em situações de risco de vida. Ao ver-se acossados, nas ruas, nos batalhões e nos postos, por inimigos decididos a tudo e incomparavelmente mais armados e municiados, os policiais paulistas, naturalmente, correram às lojas de armamentos para trocar o leite das crianças por meios elementares de defesa. Com enorme surpresa, descobriram que um determinado item da lei do desarmamento, que até então jazia inerte num papel, tinha acabado de entrar em vigor: não podiam comprar munição nenhuma sem autorização escrita da Polícia Federal. Comerciantes de armas relatam que viram policiais saírem de suas lojas chorando, conscientes de que estavam condenados à morte sem apelação. Se me disserem que o sr. ministro da Justiça ignorava essa armadilha, responderei então que ele é o mais estúpido incompetente que já passou pelo seu cargo, já que a entidade encarregada de fornecer as autorizações repentinamente exigidas e faltantes está sob o seu comando direto. Mas somente um país muito louco, muito alienado, mantém nesse cargo, numa hora dessas, o advogado pessoal do próprio chefe da insurreição. Como defensor de Marcola, o sr. Márcio Thomaz Bastos tem confiabilidade zero até mesmo para dar uma opinião imparcial quanto aos acontecimentos da semana passada, quanto mais para reter em suas mãos, com avareza assassina, os meios de defesa que teriam podido salvar centenas de pessoas.

7 - Aqueles que acima da suspeita racional coloquem a crença dogmática na idoneidade do governo petista podem apostar numa conjunção fortuita de fatores, na santa e pura coincidência. Eu é que não.P.S.- A situação de total desamparo em que o governo brasileiro deixa os policiais, entregando-os à mercê dos criminosos, já é um fato oficialmente reconhecido pela justiça norte-americana. No fim de abril, um tribunal da Flórida concedeu asilo político a um policial de Minas Gerais por reconhecer que, após matar em tiroteio um importante líder do narcotráfico local, o infeliz estava tão desguarnecido quanto um pato de plástico num estande de tiro. Voltarei ao assunto num próximo artigo. Como a promotoria abdicou de recorrer da sentença, a decisão está incorporada à jurisprudência americana e valerá para os casos subseqüentes. Os policiais brasileiros propositadamente deixados sem munição na hora do aperto já não podem dizer que não têm a quem recorrer: esqueçam o sr. Márcio Thomaz Bastos, peçam socorro à justiça de um país onde existe justiça.

Publicado pelo Diário do Comércio em 22/05/2006.

06/05/2006

A VERBORRAGIA DOS INTELECTUAIS

por Rodrigo Constantino

Quando algumas pessoas afirmam que a resposta para todos os nossos males encontra-se na palavra mágica “educação”, inevitavelmente me vem à cabeça a figura de Marilena Chauí. A professora da USP tem até doutorado, mas defende tudo de errado no mundo. Não que eu menospreze a relevância da educação. Ela é fundamental, sem dúvida. Apenas não é a panacéia que alguns pensam, como se fosse curar todas as doenças do nosso povo. Creio que o buraco é mais embaixo. Somos prisioneiros de uma mentalidade torta, que deposita no Estado uma fé messiânica, transferindo a responsabilidade, que é individual, para entes coletivos. Há um grave problema cultural no país. Somente aprender a ler e escrever não resolve isso. Marilena Chauí é a prova disso.

O contra-exemplo para quem deposita toda a fé na educação está em Cuba. Dizem que não há analfabetos naquela ilha-presídio. No entanto, sobra miséria, enquanto Fidel aparece entre os mais ricos do mundo, segundo a revista Forbes, que avalia em quase um bilhão de dólares sua fortuna. Os cubanos são analfabetos funcionais. Como disse Mário Quintana, “os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não lêem”. De que adianta saber ler e ter apenas um jornal como fonte de “informação”, controlado pelo ditador? Para que vale saber ler e ser vítima de doutrinação ideológica desde cedo, nas escolas? O que importa ter diploma e não ter emprego? Temos taxistas engenheiros e prostitutas diplomadas. Isso é o resultado de “educação” sem liberdade econômica. Fica então a pergunta: qual educação é válida?

Voltando ao exemplo de Marilena Chauí, temos nessa intelectual o ícone das pregações esquerdistas que sempre fracassaram, trazendo infinita miséria para as cobaias dessas experiências grotescas. Lembro que o socialismo não foi idealizado por proletários, mas sim por intelectuais eruditos. A doutora Chauí, que tenta culpar fatores exógenos pela enorme crise moral que seu querido partido se meteu, defende aberrações como o MST e ainda enxerga importância no Fórum Social Mundial, cacofonia sem propostas concretas que serve apenas de palco para críticas vazias. O “outro mundo possível” pregado pelos seus participantes é na verdade a Utopia, o “não-lugar”, que na prática leva ao caos e terror dos países que testaram o comunismo. O fato de Chauí ter um doutorado parece não ajudá-la a enxergar o óbvio, partindo da premissa altamente questionável de que ela é honesta intelectualmente.

Os absurdos pregados por Chauí parecem ser infindáveis. A professora considera que justiça “consiste em tornar iguais os desiguais”. Como seres humanos sempre serão diferentes em inúmeros aspectos – tais como altura, beleza, peso e gostos – podemos concluir que tal igualdade diz respeito somente ao fator financeiro. Tamanho materialismo só pode ser fruto de uma grande inveja de quem detesta o sucesso alheio. Afinal, riqueza não é estática, mas sim dinâmica e criada por indivíduos. Para um ficar rico, o outro não tem que ficar pobre. Defender a igualdade material, tirando dos ricos para dar aos pobres, é imoral, além de ineficiente, pois nenhuma nova riqueza será criada assim. Fica também a suspeita de hipocrisia, dado que a professora vive com bem mais conforto que a média, e poderia começar sua “justiça social” doando seus bens materiais para pessoas mais pobres. Defender o altruísmo com o esforço alheio é fácil.

Marilena Chauí culpa o “neoliberalismo” pelos problemas brasileiros. Como pode alguém com tanta erudição desconhecer que o liberalismo passou mais distante do Brasil que Plutão da Terra? Será que tanta “educação” não foi suficiente para a intelectual saber que estamos depois da octogésima posição no ranking de liberdade econômica tanto do Heritage como do Frasier, conhecidos institutos internacionais? Que “neoliberalismo” é esse onde abrir uma empresa é tarefa hercúlea, e fechar é impossível? Onde está a liberdade econômica quando a burocracia controla cada detalhe dos negócios? O Brasil é tudo, menos liberal. Chauí, com mestrado e doutorado, não sabe disso?

Em resumo, educar o povo é crucial, uma condição necessária para o progresso da nação. Mas não parece ser suficiente. Afinal, qual educação será dada é uma questão fundamental. O que será lido quando o povo souber ler? Quando vemos famosos intelectuais defendendo ideologias totalmente fracassadas, fica a dúvida: será que o povo poderá ter uma educação decente sob a tutela de professores como Marilena Chauí? Me parece que antes de tudo os brasileiros precisam de um antídoto contra a verborragia dos intelectuais de esquerda. A maioria das desgraças humanas não foi parida por idéias de completos ignorantes, mas sim por intelectuais de renome, como a senhora Marilena Chuaí.

http://rodrigoconstantino.blogspot.com

Rodrigo Constantino é economista, formado pela PUC-RJ, com MBA de Finanças pelo IBMEC.

03/05/2006

A BARBÁRIE DO “ESPECIALISMO”

Jose Ortega y Gasset

A tese era que a civilização do século XIX produziu automaticamente o homem-massa. Convém não fechar sua exposição geral sem analisar, num caso particular, a mecânica dessa produção. Desta sorte, ao concretizar-se, a tese ganha em força persuasiva.

Esta civilização do século XIX, dizia eu, pode resumir-se em duas grandes dimensões: democracia liberal e técnica. Tomemos agora somente a última. A técnica contemporânea nasce da copulação entre o capitalismo e a ciência experimental. Não toda técnica é científica. Aquele que fabricou os machados de pedra, no período chelense, carecia de ciência, e, não obstante, criou uma técnica. A China chegou a um alto grau de tecnicismo sem suspeitar em nada a existência da física. Só a técnica moderna da Europa possui uma raiz científica, e dessa raiz lhe vem seu caráter específico, a possibilidade de um ilimitado progresso. As demais técnicas — mesopotâmica, nilota, grega, romana, oriental — espraiam-se até um ponto de desenvolvimento que não podem ultrapassar, e apenas o tocam começam a retroceder em lamentável involução.
Esta maravilhosa técnica ocidental tornou possível a maravilhosa proliferação da casta européia. Recorde-se o dado de que tomou seu vôo este ensaio e que, como eu disse, encerra germinalmente todas estas meditações. Do século V a 1800 a Europa não consegue ter uma população superior a 180 milhões. De 1800 a 1914 ascende a mais de 460 milhões. O pulo é único na história humana. Não há dúvida de que a técnica — junto com a democracia liberal — engendrou o homem-massa no sentido quantitativo desta expressão. Mas estas páginas tentaram mostrar que também é responsável da existência do homem-massa no sentido qualitativo e pejorativo do termo.

Por “massa” — prevenia eu no princípio — não se entende especialmente o obreiro; não designa aqui uma classe social, mas uma classe ou modo de ser homem que se dá hoje em todas as classes sociais, que por isso mesmo representa o nosso tempo, sobre o qual predomina e impera. Agora vamos ver isso com sobrada evidência.

Quem exerce o poder social? Quem impõe a estrutura de seu espírito na época? Sem dúvida, a burguesia. Quem, dentro dessa burguesia é considerado como o grupo superior, com a aristocracia do presente? Sem dúvida, o técnico: engenheiro, médico, financista, professor etc. etc. Quem, dentro do grupo técnico, o representa com maior altitude e pureza? Sem dúvida, o homem de ciência. Se um personagem astral visitasse a Europa, e com ânimo de julgá-la lhe perguntasse por que tipo de homem, entre os que a habitam, preferia ser julgada, não há dúvida de que a Europa apontaria satisfeita e certa de uma sentença favorável, seus homens de ciência. É claro que o personagem astral não perguntaria por indivíduos excepcionais, mas procuraria a
regra, o tipo genérico “homem de ciência”, cume da humanidade européia.

Pois bem: o homem de ciência atual é o protótipo do homem-massa. E não por casualidade, nem por defeito unipessoal de cada homem de ciência, mas porque a técnica mesma — raiz da civilização — o converte automaticamente em homem-massa; quero dizer, faz dele um primitivo, um bárbaro moderno.

A coisa é muito conhecida: fez-se constar inúmeras vezes; mas, somente articulada no organismo deste ensaio, adquire a plenitude de seu sentido e a evidência de sua gravidade.
A ciência experimental inicia-se ao finalizar o século XVI (Galileu), consegue constituir-se nos finais do XVII (Newton) e começa a desenvolver-se nos meados do XVIII. O desenvolvimento de algo é coisa diferente de sua constituição e está submetido a condições diferentes. Assim, a constituição da física, nome coletivo da ciência experimental, obrigou a um esforço de unificação. Tal foi a obra de Newton e demais homens de seu tempo. Mas o desenvolvimento da física iniciou uma faina de caráter oposto à unificação para progredir, a ciência necessitava que os homens de ciência se especializassem. Os homens de ciência, não a ciência. A ciência não é especialista. Ipso facto deixaria de ser verdadeira. Nem sequer a ciência empírica, tomada na sua integridade, é verdadeira se a separamos da matemática, da lógica, da filosofia. Mas o trabalho nela tem de ser — irremissivelmente — especializado.

Seria de grande interesse, e maior utilidade que a aparente à primeira vista, fazer uma história das ciências físicas e biológicas, mostrando o processo de crescente especialização no trabalho dos investigadores. Isso faria ver como, geração após geração, o homem de ciência tem sido constrangido, encerrado num campo de ocupação intelectual cada vez mais estreito. Mas não é isto o importante que essa história nos ensinaria, mas justamente o inverso: como em cada geração o científico, por ter de reduzir sua órbita de trabalho, ia progressivamente perdendo contato com as demais partes da ciência, com uma interpretação integral do universo, que é o único merecedor dos nomes de ciência, cultura, civilização européia.

A especialização começa, precisamente, num tempo que chama homem civilizado ao homem “enciclopédico”. O século XIX inicia seus destinos sob a direção de criaturas que vivem enciclopedicamente, embora sua produção tenha já um caráter de especialismo. Na geração seguinte, a equação se deslocou, e a especialidade começa a desalojar dentro de cada homem de ciência a cultura integral. Quando em 1890 uma terceira geração assume o comando intelectual da Europa, encontramo-nos com um tipo de científico sem exemplo na história. É um homem que, de tudo quanto há de saber para ser um personagem discreto, conhece apenas determinada ciência, e ainda dessa ciência só conhece bem a pequena porção em que ele é ativo investigador. Chega a proclamar como uma virtude o não tomar conhecimento de quanto fique fora da estreita paisagem que especialmente cultiva, e denomina diletantismo a curiosidade pelo conjunto do saber.

O caso é que, fechado na estreiteza de seu campo visual, consegue, com efeito, descobrir novos fatos e fazer avançar sua ciência, que ele apenas conhece, e com ela a enciclopédia do pensamento, que conscienciosamente desconhece. Como foi e é possível coisa semelhante? Porque convém repisar a extravagância deste fato inegável: a ciência experimental progrediu em boa parte mercê do trabalho de homens fabulosamente medíocres, e menos que medíocres. Quer dizer, que a ciência moderna, raiz e símbolo da civilização atual, deu guarida dentro de si ao homem intelectualmente médio e lhe permite operar com bom êxito. A razão disso está no que é, ao mesmo tempo, vantagem maior e perigo máximo da ciência nova e de toda civilização que esta dirige e representa: a mecanização. Uma boa parte das coisas que é preciso fazer em física e em biologia é faina mecânica de pensamento que pode ser executada por qualquer pessoa. Para os efeitos de inúmeras investigações é possível dividir a ciência em pequenos segmentos, encerrar-se em um e desinteressar-se dos demais. A firmeza e exatidão dos métodos permitem esta transitória e prática desarticulação do saber. Trabalha-se com um desses métodos como com uma máquina, e nem sequer é forçoso para obter abundantes resultados possuir idéias rigorosas sobre o sentido e fundamento deles. Assim a maior parte dos científicos propelem o progresso geral da ciência encerrados num nicho de seu laboratório, como a abelha no seu alvéolo.

Por isso cria uma casta de homens sobremodo estranhos. O investigador que descobriu um novo fato da Natureza tem por força de sentir uma impressão de domínio e de segurança em sua pessoa. Com certa aparente justiça se considerará como “um homem que sabe”. E, com efeito, nele se dá um pedaço de algo que, junto com outros pedaços não existentes nele, constituem verdadeiramente o saber. Esta é a situação íntima do especialista, que nos primeiros anos deste século chegou à sua mais frenética exageração. O especialista “sabe” muito bem seu mínimo rincão de universo; mas ignora basicamente todo o resto.

Eis aqui um precioso exemplar deste estranho homem novo que eu tentei, por uma e outra de suas vertentes e aspectos, definir. Eu disse que era uma configuração humana sem igual em toda a história. O especialista serve-nos para concretizar energicamente a espécie e fazendo ver todo o radicalismo de sua novidade. Porque outrora os homens podiam dividir-se, simplesmente, em sábios e ignorantes, em mais ou menos sábios e mais ou menos ignorantes. Mas o especialista não pode ser submetido a nenhuma destas duas categorias. Não é um sábio, porque ignora formalmente o que não entra na sua especialidade; mas tampouco é um ignorante, porque é “um homem de ciência” e conhece muito bem sua porciúncula de universo. Devemos dizer que é um sábio ignorante, coisa sobremodo grave, pois significa que é um senhor que se comportará em todas as questões que ignora, não como um ignorante, mas com toda a petulância de quem na sua questão especial é um sábio.

E, com efeito, este é o comportamento do especialista. Em política, em arte, nos usos sociais, nas outras ciências tomará posições de primitivo, e ignorantíssimo; mas as tomará com energia e suficiência, sem admitir — e isto é o paradoxal — especialistas dessas coisas. Ao especializá-lo a civilização o tornou hermético e satisfeito dentro de sua limitação; mas essa mesma sensação íntima de domínio e valia o levará a querer predominar fora de sua especialidade. E a conseqüência é que, ainda neste caso, que representa um maximum de homem qualificado — especialismo — e, portanto, o mais oposto ao homem-massa, o resultado é que se comportará sem qualificação e como homem-massa em quase todas as esferas da vida.
A advertência não é vaga. Quem quiser pode observar a estupidez com que pensam, julgam e atuam hoje na política, na arte, na religião e nos problemas gerais da vida e do mundo os “homens de ciência”, e é claro, depois deles, médicos, engenheiros, financistas, professores, etc. Essa condição de “não ouvir”, de não se submeter a instâncias superiores que reiteradamente apresentei como característica do homem-massa, chega ao cúmulo nesses homens parcialmente qualificados. Eles simbolizam, e em grande parte constituem o império atual das massas, e sua barbárie é a causa mais imediata da desmoralização européia.

Por outra parte, significam o mais claro e preciso exemplo de como a civilização do último século abandonada à sua própria inclinação, produziu esse broto de primitivismo e barbárie.
O resultado mais imediato desse especialismo não compensado tem sido que hoje, quando há maior número de “homens de ciência” que nunca, haja muito menos homens “cultos” que, por exemplo, em 1750. E o pior é que com esses perdigueiros do forno científico nem sequer está garantido o progresso íntimo da ciência. Porque esta necessita de tempo em tempo, como orgânica regulação de seu próprio incremento, um trabalho de reconstituição, e, como eu disse, isso requer um esforço de unificação, cada vez mais difícil, que cada vez complica regiões mais vastas do saber total. Newton pode criar seu sistema físico sem saber muita filosofia, mas Einstein precisou saturar-se de Kant e de Mach para poder chegar a sua aguda síntese. Kant e Mach — com estes nomes simboliza-se só a massa enorme de pensamentos filosóficos e psicológicos que influíram em Einstein — serviram para liberar a mente desse e deixar-lhe a via livre para sua inovação. Mas Einstein não é suficiente. A física entra na crise mais profunda de sua história, e só poderá salvá-la uma nova enciclopédia mais sistemática que a primeira.
O especialismo, pois, que tornou possível o progresso da ciência experimental durante um século, aproxima-se a uma etapa em que não poderá avançar por si mesmo se não se encarrega uma geração melhor de construir-lhe um novo forno mais poderoso.

Mas se o especialista desconhece a fisiologia interna da ciência que cultiva, muito mais radicalmente ignora as condições históricas de sua perduração, isto é, como devem estar organizados a sociedade e o coração do homem, para que possa continuar havendo investigadores. A decadência de vocação científica que se observa nestes anos — à qual já aludi — é um sintoma preocupador para todo aquele que tenha uma idéia clara do que é civilização, a idéia que sói faltar ao típico “homem de ciência”, cume de nossa atual civilização. Também ele acredita que a civilização está aí, simplesmente, como a crosta terrestre e a selva primigênea.

Texto integral: http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/ortega.html