30/12/2008

Lições das Missas dominicais pós-Vaticano II – Parte XIII

O Evangelho deste domingo, 28/12/2008, na Missa de Paulo VI, é Lc. 2, 22-40, o quarto dos Mistérios Gozosos. É o Evangelho do Nunc dimittis: “Agora, Senhor, despedi em paz o vosso servo, segundo a vossa palavra. Porque os meus olhos viram a salvação que nos destes. Que preparastes, diante de todos os povos. Luz para esclarecer as nações, e para a glória de Israel, vosso povo”. Isso é o que diz Simeão ao ver o Messias. Diz ainda a Maria: “Eis que Ele é destinado a ser ocasião de queda e de ressurgimento para muitos em Israel e para ser sinal de contradição, e tu mesma terás a alma transpassada por uma espada, a fim de se revelarem os pensamentos de muitos corações”.

Acaso Simeão diz que Ele será motivo de paz para todos? Acaso diz que Ele trará o fim da pobreza para todos, o fim dos poderosos que exploram os fracos, o estabelecimento do Reino de Deus aqui na terra?

Pois é esse o entendimento de Pe. Paulo Bazaglia, no seu texto “Olhos para ver a salvação de Deus”, no folheto "O Domingo". Diz o padre: “Mas aqueles olhos de Simeão e Ana [a profetisa] ansiaram por algo bem mais profundo: a libertação concreta para todo o povo de Deus. Libertação que Jesus veio realizar, sendo ‘sinal de contradição’ ao elevar os pobres e abaixar os poderosos. Libertação da miséria, que faz as pessoas morrerem de fome, libertação de preconceitos e mentalidades que impedem às pessoas ser elas mesmas.”

Viram o que o padre considera mais profundo: libertação da miséria, dos preconceitos. O legal para o padre é a gente ser a gente mesmo! Para esse padre modernista, nossa Redenção é algo menor frente a libertação da miséria e dos preconceitos, coisa que aliás Jesus não veio trazer; “pobres sempre os terão entre vós”. Os fariseus também achavam mais profundo curar doentes do que perdoar os pecados (Lc. 5, 17-26). Ou seja, colocavam as coisas sensíveis acima das sobrenaturais. Esse é o estilo de quem nunca teve ou já perdeu a fé.

E o que é a libertação dos preconceitos de que fala o Pe. Bazaglia? É achar tudo legal, tudo aceitável, tudo um barato? É considerar toda religião válida; aquela história de que todas salvam? Raça de víboras! Jesus é sinal de contradição justamente por isso: Ele nos ensina a ser preconceituosos contra vocês, contra o mal. Essa é a divisão do mundo: os bons de um lado e os maus de outro, as ovelhas de um lado e os cabritos de outro. De que lado o senhor está, padre?

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21/12/2008

Lições das Missas dominicais pós-Vaticano II – Parte XII

O Evangelho deste domingo, 21/12/2008, na Missa de Paulo VI é Lc. 1, 26-38, a Anunciação. “O anjo entrou onde ela estava e disse: ‘Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo’. Maria ficou perturbada com essas palavras e começou a pensar qual seria o significado da saudação.”

Pe. Nilo Luza, em seu artigo ao final do folheto, diz: “Ela é convidada a colaborar com Deus na geração de um filho. Obediente e atenta aos projetos de Deus, embora inicialmente relutasse um pouco, aceita a proposta do anjo.”

O que chama a atenção é o entendimento de pe. Luza sobre Maria relutar em aceitar a “proposta” de Deus. Será que Maria relutou em aceitar ser mãe do Salvador?

O versículo 29 na Vulgata é “quae cum vidisset turbata est in sermone eius et cogitabat qualis esset ista salutatio”. Assim, o verbo é turbada, do verbo turbar (turvar, perturbar, agitar, revolver). Maria ficou agitada, confusa com as palavras do anjo (sermone eius).

Dois comentários da Catena Áurea nos ajudam a entender a situação.

“Conheceu-se a Virgem por seu pudor, porque se turbou. Agitar-se é próprio das virgens, o sobressaltar-se quando um homem se aproxima e o temer todo contato com homens. Aprendam, todas as virgens, a evitar toda licenciosidade de palavras. Maria se perturbava até com a saudação do anjo”. (Santo Ambrósio)

“Como ela estava acostumada àquele tipo de aparições, o evangelista não atribui a turbação ao que ela vê, mas ao que ouve, dizendo: ‘Se turbou com as palavras do anjo.’ O evangelista considerava o pudor e a prudência da Virgem, ao mesmo tempo que a voz do anjo. Ouvida a alegra notícia, ela examina o que se havia dito e não resiste abertamente por incredulidade, nem se submete apressadamente, evitando a pressa de Eva e a resistência de Zacarias. Por isso continua: ‘E pensava que saudação seria esta’, não sobre a concepção. Pois ignorava a profundidade do mistério. Mas será a saudação libidinosa, como a que um homem dirige a uma virgem? É Divino, pois se faz menção a Deus, dizendo: ‘O Senhor está contigo’.” (Griego)

Assim, Maria não reluta em aceitar a “proposta” de Deus. Ela “pensava que saudação seria esta”. Ela não pensava “sobre a concepção”. Em toda a Escritura, os homens saúdam os anjos. Agora um anjo veio saudar Maria. Quem, em pleno uso da razão, não se turbaria na situação de Maria? Maria, além do pudor virginal, estava exercitando o “discernimento dos espíritos”. E, claro, quando ela compreendeu a situação, disse: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra.”

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17/12/2008

Capítulo III – Sobre o Sr. Rudyard Kipling e Fazendo o Mundo Pequeno: Parte I

Gilbert Keith Chesterton

Não há assunto desinteressante sobre a terra; a única coisa que existe são pessoas desinteressadas. Nada há tão necessário quanto uma defesa dos entediantes. Quando Byron dividiu a humanidade em entediantes e entediados,[1] ele deixou de notar que as mais altas qualidades pertencem aos entediantes e as mais baixas, aos entediados, dentre os quais ele se encontrava. O entediante, por seu brilhante entusiasmo, por sua solene felicidade, pode, de alguma forma, ter se tornado poético. O entediado provou-se certamente prosaico.

Podemos, sem dúvida, considerar inoportuno contar todas as folhas da grama ou das árvores; mas isso não seria por causa de nossa ousadia ou alegria, mas por causa de nossa falta de ousadia ou alegria. O entediante seguiria em frente, ousado e alegre, e consideraria as folhas da grama tão esplêndidas quanto espadas de um exército. O entediante é mais forte e mais contente do que nós; é um semideus – não, ele é um deus. Pois, são os deuses que não se cansam da iteração das coisas; para eles, o entardecer é sempre novo, e a última rosa é tão vermelha quanto a primeira.

O sentimento de que tudo é poético é uma coisa sólida e absoluta; não é uma mera questão de fraseologia ou persuasão. Não é meramente verdade, é averiguável. Os homens podem ser desafiados a negá-lo; os homens podem ser desafiados a mencionar qualquer coisa que não seja poética. Lembro-me que, há muito tempo, um sensível subeditor se aproximou de mim com um livro nas mãos intitulado “Sr. Smith” ou “A família Smith”, ou algo parecido. Ele disse, “Bem, tu não conseguirás tirar, deste livro, nada do teu miserável misticismo,” ou palavras semelhantes. Fico contente em dizer que o decepcionei; mas a vitória foi tão óbvia e fácil! Na maioria dos casos, o nome não é poético, mas o fato é. No caso de Smith, o nome é tão poético que deve ser árdua e heróica a tarefa de suportá-lo. O nome de Smith é o nome de uma profissão[2] que mesmo os reis respeitavam, nome que pode cobrar a metade da glória daquela arma virumque que todos os épicos aclamaram. O espírito do ferreiro [smithy] é tão próximo do espírito da canção que eles se misturam em milhões de poemas, e cada ferreiro é um harmonioso ferreiro.

Mesmo a criança do vilarejo sente que, de algum modo obscuro, o ferreiro é poético – da mesma forma que não o são o dono da mercearia e o sapateiro – quando ele dança em meio a fagulhas e ensurdecedoras marteladas na caverna daquela violência criativa. O repouso bruto da Natureza, o perspicácia apaixonada do homem, o mais resistente dos metais da terra, o mais estranho dos elementos da terra, o inconquistável ferro subjugado pelo seu único conquistador, a roda e o arado, a espada e o martelo, a ordenação dos exércitos e todas as histórias das armas, todas essas coisas estão escritas – brevemente, é verdade, mas bem legíveis – no cartão de visitas do Sr. Smith. Mesmo assim, nossos romancistas chamam seus heróis de “Aylmer Valence,” que não significa nada, ou ainda “Vernon Raymond,” que também não significa nada, quando está em seu poder dar a eles esse sagrado nome de Smith – este nome feito de ferro e chama. Seria natural que certa arrogância, certo maneio de cabeça, certo gesto nos lábios, distinguissem cada um dos que tem o nome de Smith. Talvez seja assim; eu acredito. Mas dentre os novos-ricos não estão os Smiths. Desde o mais obscuro alvorecer da história, esse clã se lançou na batalha; seus troféus estão em cada mão; seu nome está em todo o lugar; é mais antigo que as nações e seu signo é o Martelo de Thor. Mas, como também observei, esse não é o caso usual. É bastante comum que coisas comuns sejam poéticas; não é tão comum que nomes comuns sejam poéticos. Na maioria dos casos, é o nome que é o obstáculo. Um grande número de pessoas fala como se essa nossa alegação, que todas as coisas são poéticas, fosse uma mera criatividade literária, um jogo de palavras. Precisamente o contrário é verdade. É a idéia de que algumas coisas não são poéticas que é literária, que é um mero produto das palavras. A palavra “signal-box” [cabine de comando de sinal[3]] não é poética. Mas a coisa cabine de comando de sinal é poética; é um local onde homens, numa agonia de vigilância, acendem luzes vermelho-sangue e verde-marinho a fim de evitar a morte de outros homens. Essa é a descrição simples e genuína do que ela é; a prosa aparece apenas na descrição da coisa. A palavra “pillar-box” não é poética. Mas a coisa pillar-box o é; ela é o lugar a que amigos e amantes confiam suas mensagens, conscientes de que quando assim o fizerem, elas serão sagradas, e não poderão ser tocadas, não somente por outros, mas nem mesmo (toque religioso!) por eles mesmos. Aquela torre vermelha [lugar das cabines de comando ao longo da ferrovia] é um dos últimos templos. Postar uma carta ou se casar estão dentre as poucas coisas inteiramente românticas; pois para ser inteiramente romântica, uma coisa dever ser irrevogável. Pensamos que pillar-box é prosaica, porque não há rima para ela. Pensamos que pillar-box não é poética, porque nunca a vimos num poema. Mas o fato ousado está inteiramente do lado da poesia.

Uma signal-box é chamada apenas uma signal-box; ela é a casa da vida e da morte. Uma pillar-box é chamada apenas uma pillar-box; ela é um santuário das palavras humanas. Se você acha o nome “Smith” prosaico não é porque você seja prático e sensível; é porque você é excessivamente afetado por refinamentos literários. O nome grita poesia a você. Se você acha o contrário, é porque você está impregnado, encharcado, com reminiscências verbais, porque você lembra tudo de Punch[4] (e suas tirinhas cômicas) sobre o Sr. Smith estar bêbado ou intimidado. Todas essas coisas lhe foram apresentadas poéticas. Foi somente por um longo e elaborado processo de esforço literário que você as fez prosaicas.

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[1] “Society is now one polish'd horde, / Form'd of two mighty tribes, the Bores and Bored.” Don Juan, Canto XIII, estrofe 95. (N. do T.)
[2] Ferreiro, forjador. (N. do T.)
[3] Para controle de tráfego ferroviário. (N. do T.)
[4] Revista britânica de humor e sátira publicada de 1841 a 1992. (N. do T.)


Ver também Hereges de G.K. Chesterton e Hereges - Capítulo I. Observações Iniciais sobre a Ortodoxia: Parte I, Hereges - Capítulo I. Observações Iniciais sobre a Ortodoxia: Parte II, Capítulo I. Observações Iniciais sobre a Ortodoxia: Final, Hereges - Capítulo II – Sobre o espírito negativista: Parte I, Hereges - Capítulo II – Sobre o espírito negativista: Final

14/12/2008

Duas notas de um católico perplexo

Editora Vozes: uma editora católica?

Sempre que visito uma livraria da Editora Vozes (e também da Paulus) me entristeço com os livros de comunistas confessos publicados pela editora ou vendidos pela livraria. É um desfile de betos e boffs que enjoa o estomago.

No caminho de casa até a livraria, vou me preparando, prometendo-me não olhar as estantes e me concentrar no livro que quero adquirir. Digo a mim mesmo: “Chegue lá e peça o livro ao atendente; verifique se é isso que você quer, pague e vá embora.”

Outro dia, fui com meu filho comprar, para ele, o “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”, de São Luis Maria Grignion de Montfort. Muito auto-disciplinado, pedi ao atendente o livro e fui direto ao caixa. Chega o meu filho e me diz: “Pai, naquela estante ali tem um livro de Calvino.” Disse a ele: “Não filho, a Editora Vozes é católica e nunca publicaria um livro de Calvino.” Pensei comigo mesmo: “Vá lá, betos e boffs, mas Calvino não!” “Pai, está ali o livro de Calvino. Ele não chama João Calvino?”, insistiu meu filho. Fui lá e vi, com meus próprios olhos, “A Instituição da Religião Cristã”. O significado desse livro nos explica Belloc, em As Grandes Heresias: “Não havia nenhuma doutrina construtiva externa em oposição ao antigo corpo doutrinal sob o qual nossos pais viveram, até que um homem de gênio surgiu com um livro como seu instrumento, e um poder pessoal violento de raciocínio e de pregação para atingir seu fim. Este homem era francês, Jean Cauvin (ou Calvino) ...qualquer que tenha sido sua motivação, ele foi certamente o fundador de uma nova religião. Pois foi João Calvino que estabeleceu uma anti-Igreja.”

Expliquei para meu filho o estado lastimável em que se encontra o dito “catolicismo” no Brasil e fui embora, muito mais triste do que tinha antecipado que ficaria ao sair de casa. O livro de São Luis Montfort se tornou ainda mais necessário de ser lido. Rezemos à Santíssima Virgem e a seu Santo Esposo pela Igreja.

A consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria

Lemos no texto do Prof. Orlando Fedeli, Fátima: um "segredo" contendo um enigma envolto em um mistério, o seguinte:

“No primeiro segredo, Nossa Senhora mostrou aos três pastorinhos de Aljustrel ‘o inferno para onde vão os pecadores’, e explicou-lhes que foram os pecados dos homens que provocaram o castigo da I Guerra Mundial (1914-1917).

Nossa Senhora mostrou-nos um grande mar de fogo que parecia estar debaixo da terra. Mergulhados em esse fogo os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras, ou bronzeadas com forma humana, que flutuavam no incêndio levadas pelas chamas que delas mesmas saíam, juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das fagulhas nos grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizava e fazia estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes e negros. Esta vista foi um momento, e graças à nossa boa Mãe lá do céu, que antes nos tinha prevenido com a promessa de nos levar para o céu (na primeira aparição). Se assim não fosse, creio que teríamos morrido de susto e pavor. Em seguida, levantamos os olhos para Nossa Senhora, que nos disse com bondade e tristeza: 'Vistes o inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores. Para salvá-las, Deus quer estabelecer no mundo a devoção a meu Imaculado Coração. Se fizerem o que eu disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz.’

“O segundo segredo: ‘A guerra vai acabar, mas, se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. Quando virdes uma noite iluminada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre. Para impedi-la, virei pedir a consagração da Rússia a meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz; se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja, os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas, por fim o meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia, que se converterá, e será concedido ao mundo algum tempo de paz.’

Todos sabemos que a Rússia não foi consagrada e estamos sabendo, pouco a pouco, desde a abertura dos arquivos de Moscou, quais foram os erros que ela “espalhará pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja ...” A mais recente notícia que temos é comentada por Olavo de Carvalho em seu artigo, URSS, a mãe do nazismo. Vejam lá de que Nossa Senhora estava falando.

10/12/2008

Olavo descreve previsão de Belloc

No artigo A Elite que Virou Massa, Olavo de Carvalho descreve o estado de coisas que vemos hoje no mundo e que Hilaire Belloc chamava escravidão. Vamos ao texto de Olavo. Transcrevo um trecho abaixo. Os negritos são meus.

“Em 1939, Eric Voegelin observava que as condições essenciais para a democracia, tal como haviam sido concebidas no século XVIII, já não existiam mais. De um lado, a economia e a administração pública tinham se tornado tão complexas que o cidadão comum já não preenchia as condições mínimas para formar uma opinião racional a respeito: sua razão refluíra para o círculo estreito das atividades profissionais e familiares, deixando suas escolhas políticas à mercê de apegos emocionais, desejos pueris, sonhos e fantasias que o tornavam presa fácil da propaganda totalitária. De outro lado, as novas classes surgidas na sociedade moderna – o proletariado urbano, o baixo funcionalismo público, os empregados de escritório – eram bem diferentes dos pequenos proprietários que criaram a democracia iluminista: eram exemplares do “homem massa” de Ortega y Gasset, menos inclinados à busca da independência pessoal do que a confiar-se cegamente à mágica do planejamento estatal e da disciplina coletiva. Tudo, no mundo, convidava ao totalitarismo.

“Passados setenta anos, a composição da sociedade tornou-se ainda mais vulnerável à manipulação totalitária. O advento de massas imensas de subempregados, dependentes em tudo da proteção estatal, somada à destruição da intelectualidade superior por meio da transformação global das universidades em centros de propaganda revolucionária, reduziu praticamente o eleitorado inteiro à condição de massa de manobra.”

Olavo segue enumerando as conseqüências da situação descrita acima para a democracia. Vale a pensa ler o artigo.

Vamos agora a Belloc. Em seu livro “As Grandes Heresias”[1], escrito em 1938, ele descreve uma das características do que ele chama de Ataque Moderno à Igreja Católica. É a volta da escravidão. Os negritos são meus.

“Em primeiro lugar, estamos testemunhando um renascimento da escravidão, o resultado necessário da negação da liberdade quando essa negação vai um passo além de Calvino e nega a responsabilidade perante Deus tanto quanto a falta de poder no interior do homem. Duas formas de escravidão que estão gradualmente aparecendo, e que amadurecerão mais e mais com o passar do tempo sob o efeito do ataque moderno contra a Fé, são a escravidão ao Estado e às corporações privadas e indivíduos.”
(...)
“Quando o papa reinante[2], em sua Encíclica[3] falou do homem reduzido “a uma condição não muito longe da escravidão”, ele quis dizer simplesmente o que foi dito acima. Quando as famílias num Estado não possuem propriedades, então aqueles que antes eram cidadãos, se tornam escravos. Quanto mais o Estado interfere para garantir condições de segurança e suficiência, quando mais regula os salários, provê seguro compulsório, plano de saúde, educação – em geral assumindo o controle da vida dos assalariados, em benefício das companhias e homens que empregam os assalariados – mais a condição de semi-escravidão é acentuada. E, se a situação continuar por, digamos, três gerações, ela se tornará tão completamente estabelecida como um hábito social e um padrão mental que não haverá dela escapatória nos países onde um Socialismo de Estado desse tipo tenha sido forjado e incrustado ao corpo político.

“Na Europa, a Inglaterra em particular (mas muitos outros países em menor grau) adotou esse sistema. Abaixo de certo nível salarial, um homem tem garantida uma subsistência mínima, caso perca o emprego. Um salário desemprego é dado a ele pelas autoridades públicas as custa da perda de sua dignidade humana. Cada circunstância de sua família é examinada; ele fica ainda mais nas mãos dessas autoridades, quando desempregado, do que estava nas mãos de seu empregador, quando empregado. A coisa está ainda em transição; a massa de homens ainda não percebeu para qual objetivo ela tende; mas o desprezo pela dignidade humana, a potencial, senão a real, negação da doutrina do livre arbítrio, tem levado, por uma conseqüência natural, ao que são as instituições semi-servis. Estas se tornarão totalmente servis com o tempo.

“Contra o mal do sistema salário-escravidão, há tempos foi proposto, e já está agora em pleno funcionamento, certo remédio. Seu nome mais breve é comunismo: escravidão ao Estado, muito mais avançada e integral do que a primeira forma, escravidão ao capitalismo.

Como se vê, Olavo (e também Eric Voegelin) e Belloc se aproximam do assunto de perspectivas diferentes. Belloc toma como ponto de partida o fato de o Ataque Moderno ser uma heresia religiosa, contra a Igreja. Isso lhe dá um ângulo de visão diferente, mais profundo, mais elementar, mais radical. Vale pena ler o livro.

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[1] A ser publicado em 2009, pela Editora Permanência.
[2] Pio XI.
[3] Quadragesimo anno.

03/12/2008

Uma terrível mensagem de Natal: SE ELE NÃO TIVESSE VINDO

Nota: Neste Natal, o presente do blog aos seus leitores é TERRÍVEL, mas absolutamente necessária. Gustavo Corção nos alerta sobre a responsabilidade que o Natal nos trouxe, há mais de 2000 anos. “Se Eu não tivesse vindo ...”


Gustavo Corção


“Se Eu não tivesse vindo e não lhes tivesse dirigido a palavra,
eles não teriam pecado; mas agora não há desculpas
para o pecado deles” (Jo. XV, 2).

Estas palavras terríveis ditas por Jesus na noite da Ceia, devem ser lidas e meditadas com especial atenção nos atuais tempos litúrgicos, para bem apreendermos o nexo entre a Natividade e a Paixão, e sobretudo para aprendermos um vislumbre das dimensões trágicas da vinda de Jesus para a nossa Salvação. Costumamos pensar que Jesus recém-nascido trouxe ao mundo, para nos salvar, uma atmosfera com perfumes dos céus e cânticos dos anjos; costumamos associar a idéia de Natal à de um socorro da divina misericórdia, pousado no regaço da Virgem Santíssima e todo feito de delicadezas e fragrâncias; ora, é Ele mesmo, no momento supremo em que nos ensinará na última estação o segredo de Sua vinda. E diz-nos estas palavras das quais inferimos que, se não se pode dizer sem absurdo e blasfêmias que Ele nos trouxe o pecado, pode-se entretanto dizer que, a este mundo já marcado pelo pecado mal definido, cinzento, misturado ao bem de um modo desordenado, Jesus trouxe a Ordem que discrimina mal e bem, e trouxe aos homens, com preço e condição da Salvação, um sentimento mais agudo, uma responsabilidade abismal. Essa iluminação moral, que nos mostra que todo mal é uma ofensa a Deus, já estava anunciada nos clamores proféticos, mas o mundo inteiro, na confusão da cinzenta mistura muito vagamente sentia a Vontade de Deus contrariada. De uma maneira cósmica, nas catástrofes, nos incêndios e nas inundações, tinham uma vaga intuição de que os elementos irritados traduziam a irritação de uma alta instância. Mas esse vago panteísmo mais eclipsava do que elucidava o transcendental contraste do bem e do mal, e principalmente a noção de pecado pessoal cometido contra um Deus pessoal.

“Se Eu não tivesse vindo...” diz-nos Jesus na hora da Paixão não se teria realizado o plano eterno de Deus: o de oferecer aos homens um alvo, um blanco, contra o qual, nitidamente, com inacreditável ferocidade se concentrasse a maldade difusa para que o cinzento desse lugar ao claro-escuro, e o bem fosse chamado bem, e o mal, mal. “Se o mundo vos odeia, sabei que a Mim Me odiou primeiro”. E também: “Aquele que me odeia, odeia também meu Pai”.

Então, retornando pela terceira vez a terrível declaração de Jesus, diríamos que o Natal, Sua vinda, foi também a vinda do ódio mais consciente, mais nítido e mais cruel. Mas para que a humanidade pudesse abrir os olhos para essa consciência do mal como ofensa a Deus, como ódio a Deus, o Pai inventou esse recurso extremo de se tornar acessível às mãos dos homens: “Se és Deus, adivinha quem Te bateu!” Coroara de espinhos: “Salve o Rei dos Judeus!”.

E assim, por Sua vinda e por Sua Paixão, Jesus trouxe a Ordem que da ao mal o nome de mal, e ao bem o nome de bem.
“Agora já não poderão esquivar-se: Se Eu não tivesse vindo, e não lhes tivesse falado, eles não teriam pecado; mas agora o pecado que cometem, chama-se pecado, sem subterfúgios, sem pseudônimos”.

Por isso, quis o Pai, desde o princípio, que a Religião de nosso perdão fosse a Religião que por isso mesmo dá ao pecado o nome de pecado. Mas também, se na divina invenção todos os homens que se levantam contra Deus, contra Sua Vontade, contra Sua Lei são participantes da flagelação de Jesus, este com a sua bofetada, aquele com sua martelada nos pregos da cruz, aquele outro com o escarro na Santa Face, sim, sim, se a humanidade inteira, agora sem desculpas, tem participação de verdugo na Paixão, também está incluída na invenção de Deus os santos recursos que oferecem a todos os homens a participação de vítima, a participação de sacrifício oferecido ao Pai.

Na verdade, na verdade, não sei como pode um coração humano, sem estalar de dor, suportar a lembrança da profundidade de seu pecado, e a lembrança da altura de sua esperança. Nem entendo como é possível pensar na Ceia do Senhor como um ameno e festivo encontro de onde os padres e bispos tiram modelo para brincadeirinhas mais ou menos sexuadas entre jovens! Nem entendo a frivolidade com que se mexeu e remexeu no Santo Sacrifício da Missa para agradar aos heréticos, aos frívolos e aos anormais.

* * *

Uma das características de nosso tempo é justamente aquele cinzento informe, desordenado, anárquico, onde bem não é bem e mal não é mal, ou tanto faz como tanto fez. Este estado de toda uma civilização é o estuário de erros trazidos e acumulados por séculos de Revolução contra Deus, contra a Igreja, para a reconquista do ameno charco inconseqüente, que era o mundo depois do Pecado, e antes da Vinda de Cristo.

“Se não fosse minha vinda...” O Demônio para bem persegui-la, conhece melhor a Sagrada Doutrina às avessas do que os bispos modernistas ou simplesmente modernos que querem fazer da Igreja uma barraca atraente, agradável, divertida. Essa Igreja persegue Jesus pela degradação, pela inflação, pela vulgarização a fim de que, com seu apagamento, se apaguem da memória dos homens aquelas palavras: “Se Eu não tivesse vindo...” e então voltava ao mundo a mistura de mal e bem, e o tranqüilo esquecimento de Deus.

E nessa direção que trabalham todos os ditos progressistas que se esforçam por fazer da Igreja um circo, um cassino, um lupanar qualquer coisa onde possam agradar aos homens, até o desprezo de Deus.

Artigo tirado do site da Permanênca

01/12/2008

Dioceses se mobilizam em favor das vítimas de Santa Catarina

Notícia que acaba de sair no site da CNBB

Dioceses de todo o Brasil prestam solidariedade às vítimas das enchentes de Santa Catarina, que acontecem desde o penúltimo fim de semana, deixando até agora, de acordo com a Defesa Civil de Santa Catarina, oito cidades isoladas, 114 mortos, 78 mil desabrigados e desalojados.

A arquidiocese do Rio de Janeiro, por meio da Cáritas Arquidiocesana recebe doações em dinheiro que serão enviadas às dioceses catarinenses afetadas pelas chuvas. Da mesma forma agem a arquidiocese de São Paulo e a diocese de Santo André (SP), que abriram campanha até o próximo dia 31 de dezembro. Toda a arrecadação será destinada à Mitra Diocesana de Florianópolis.

A Rede Cáritas Brasileira, também reforça o apelo de solidariedade às vítimas das enchentes daquele Estado. As entidades-membro da entidade, localizadas nas áreas mais atingidas pelas chuvas, abriram três contas bancárias para receber doações em dinheiro. A Cáritas diocesana de Colatina (ES), em parceria com a Cáritas Brasileira, também está na mobilização para ajudar os catarinenses. Ainda no Espírito Santo, o bispo de Cachoeiro do Itapemirim (ES), dom Célio de Oliveira Goulart, por meio da Cáritas diocesana, da Defesa Civil e outros grupos da cidade, também deu início, neste fim de semana, a uma campanha para arrecadação de alimentos não perecíveis, roupas e calçados que serão doados aos flagelados das enchentes.

No município catarinense de Itajaí, onde 90% das casas foram atingidas pelas enchentes, as seis paróquias e os colégios católicos da cidade tornaram-se abrigos para acolher os desabrigados e desalojados. São mais de 2 mil famílias acolhidas pela Igreja de Itajaí e que permanecerão nos colégios e paróquias por um bom tempo. Um caminhão está coletando roupas, água e alimentos nas paróquias e uma conta foi aberta para receber as doações em dinheiro.

“A flagelação sensibiliza, mas a solidariedade também comove"

A Cúria diocesana de Curitiba (PR) montou um esquema para receber donativos às vítimas. Segundo o arcebispo, dom Moacyr José Vitti, “a flagelação sensibiliza, mas a solidariedade também comove”. O arcebispo alertou que é preciso rapidez e organização para atender a população desabrigada. E completou: “O coração aberto dos paranaenses e brasileiros vai amenizar os prejuízos e tornar o Natal um pouco mais feliz para centenas de milhares de pessoas atingidas”.

Na arquidiocese de Campinas (SP) as paróquias e comunidades intensificaram as iniciativas de ajuda ao povo de Santa Catarina. O arcebispo, dom Bruno Gamberini, divulgou nota ás paróquias para que não se omitam neste momento de dor: “Não podemos, neste momento, nos omitir frente ao sofrimento de tantos irmãos e irmãs”, diz o texto.

Contas Bancárias divulgadas pela Cáritas Brasileira

Florianópolis
Banco do Brasil, agência 3174-7, conta 17611-7.
Em nome de Ação Social Arquidiocesana/Flagelados SC 2008.
Informações pelo telefone (48) 3224.8776 ou pelo e-mail
asa@arquifln.org.br


Joinville
Banco BESC, agência 014, c/c 130.786-2.
A campanha é promovida pela Associação Diocesana de Promoção Social.
Informações pelo telefone (47) 3451.3715 ou pelo e-mail
adipros@diocesejlle.com.br


Blumenau
Banco Itaú, agência 6407, c/c 07004-1.
Campanha “Diocese de Blumenau - Emergência”.
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30/11/2008

Os cátaros modernos: Saramago é um deles!

Os cátaros dos séculos XI, XII e XIII emergiram de uma correnteza subterrânea que fluía desde os maniqueus dos primeiros séculos do cristianismo. Contra estes lutaram grandes santos da Igreja: santo Agostinho e santo Irineu, por exemplo. Contra aqueles lutou o grande são Domingos e, ao seu lado, a Virgem Maria. É a aparentemente infindável gnose, sempre preparada a seduzir a mente humana.

Houve uma grande batalha no centro da França, no grande século XIII, em que a Igreja conseguiu vencer os cátaros e exterminar momentaneamente a heresia que defendiam. Heresia que acabaria com a humanidade caso vingasse e se tornasse uma força social.[1]

Mas o catarismo nunca acabou. Tingiu com suas cores a Reforma e hoje em dia opera a céu aberto no mundo. Onde se vê alguém afirmando que o mundo é mau, que o aborto é bom, que o casamento é mau, que qualquer tipo de guerra é má (“não importam os motivos da guerra, a paz é mais importante que eles”), que o vegetarianismo é bom etc., estamos diante de um cátaro moderno. O catarismo moderno vem misturado com todo o tipo de crença derivada de outra doutrina que seduz a mente humana permanentemente: o panteísmo. Mas isto é outra história.

O catarismo, como o maniqueísmo, é uma revolta contra Deus: Deus criou o mundo “e viu que era bom.” (Gênesis, 1). Os cátaros negam isso e daí tiram loucas doutrinas sobre a reforma do mundo. Querem fazer o que, segundo eles, Deus não conseguiu.

Se alguém acha que isso que foi dito acima é imaginação de um blogueiro desocupado, ouçam as palavras de Saramago, dita semana passada no Brasil.

A história da humanidade é um desastre contínuo. Nunca houve nada que se parecesse com um momento de paz. Se ainda fosse só a guerra, em que as pessoas se enfrentam ou são obrigadas a se enfrentar... Mas não é só isso. Esta raiva que no fundo há em mim, uma espécie de raiva às vezes incontida, é porque nós não merecemos a vida.

“Desde muito novo orientei-me para a consciência de que o mundo está errado. Não importa aqui qual foi o grau da minha militância todos esses anos. O que importa é que o mundo estava errado, e eu queria fazer coisas para modificá-lo.


Quem pensa assim só pode ser ... comunista! E o comunismo é a doutrina política dos cátaros modernos.

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[1] Aguardem “As Grandes Heresias”, da Editora Permanência, a ser publicado em 2009, para um detalhado estudo desta e de outras heresias.

29/11/2008

Lições das Missas dominicais pós-Vaticano II – Parte XI

O Evangelho deste domingo, 23/11/2008, na Missa de Paulo VI é Mt. 25, 31-46. Belíssimas e terríveis as palavras de Jesus. É a descrição do Juízo Final: “Todos os povos da terra serão reunidos diante Dele, e Ele separará uns dos outros, assim como o pastor separa as ovelhas à sua esquerda dos cabritos.” E então Ele prossegue, para as ovelhas: “Eu estava com fome e me destes de comer ...”. E para os cabritos: “Eu estava com fome e não me destes de comer.” Espantados, ovelhas e cabritos se perguntavam quando tinham dado (ou não) de comer ao Filho do homem. Disse Ele então: “Todas as vezes que (não) fizestes isso a um desses pequeninos, foi a mim que (não) fizestes!”

O que Nosso Senhor nos está dizendo? Será que é: “Arregacemos as mangas e partamos para a construção de novo mundo, de nova sociedade, a civilização do amor”? Isso é a interpretação do Sr. Carlos Francisco Signorelli, presidente do CNLB, em seu texto no Semanário Litúrgico-Catequético, de 23/11/2008. Pessoas como o Sr. Signorelli consideram Jesus um Marx avant la lettre, como já mencionei em outro texto. Ele teria vindo ao mundo para nos ensinar como mudar as estruturas sociais, como fazer a revolução, como “construir a civilização do amor”. Já disse também, em outro lugar, que era isso exatamente o que Judas, o traidor, achava de Jesus. Ele O considerava o libertador de Israel do jugo do Império Romano.

A Catena Áurea reproduz muitos comentários dos santos e doutores da Igreja sobre esta passagem do Evangelho. Vou comentar aqui o que escreve Santa Catarina de Sena sobre esse assunto.

O texto que reproduzo abaixo é do livro Diálogo, Editora Paulus, 10ª edição de 2007; tradução, notas e introdução de Frei João Alves Basílio, OP. Note como Deus fala sobre a caridade e como ela é ou não praticada. Os negritos são meus.

“2.6 Toda virtude é praticada no próximo

“Vou explicar-lhe agora que toda virtude se realiza no próximo, bem como todo pecado.

“Toda pessoa que vive longe de mim prejudica o próximo; e a si, dado que cada um é o primeiro próximo de si mesmo. Tal prejuízo pode ser desordem geral ou pessoal. Em geral, porque sois obrigados a amar os demais como a vós mesmos. De que maneira? Socorrendo espiritualmente pela oração, dando bom exemplo, auxiliando quanto ao corpo e quanto ao espírito, conforme as necessidades. No caso de alguém nada possuir, pelo menos há de ter o desejo de auxiliar! Quem não me ama, também não ama os homens; por isso não os socorre. Quem despreza a vida da graça, prejudica antes de tudo a si mesmo, mas prejudica também os outros, deixando de apresentar diante de mim – como é seu dever – orações e aspirações em favor deles. Todo e qualquer auxílio prestado ao próximo deve provir do amor que se tem por aquela pessoa, mas como conseqüência do amor que se tem por mim. Da mesma forma, todo mal se realiza no próximo, e quem não me ama, também não tem, amor pelos outros. A origem dos pecados está na ausência da caridade para comigo e para com o homem. Para fazer o mal, basta que se deixe de fazer o bem. Contra quem se age, a quem se prejudica na prática do mal? Primeiramente contra si mesmo; depois contra o próximo. A mim, não me prejudica. Eu não posso ser atingido, a não ser no sentido de que considero feito a mim o que se faz ao homem. Será um prejuízo que leva à culpa com privação da graça e, nesse caso, coisa pior não poderia acontecer; ou será uma recusa de afeição e amor, obrigatórios e que exigem o socorro pela oração e súplicas diante de mim. Tudo isso é auxílio de ordem geral, porque é devido aos homens em comum.

O auxílio de ordem pessoal consiste na colaboração prestada às pessoas com quem convivemos, pois existe a obrigação aos homens de se ajudarem mutuamente com bons conselhos, ensinamentos, bons exemplos e qualquer outra obra boa de que se necessite. (...) Quem não me ama, certamente não agirá convenientemente e prejudicará os demais. Nem serão apenas prejuízos por omissão do bem, mas ações más e danos até repetidos.”

“Toda virtude é praticada no próximo, bem como todo pecado” é um extraordinário resumo das palavras de Jesus. Assim como Santo Tomás de Aquino dizia que chegamos ao conhecimento racional máximo de Deus a partir das coisas sensíveis, de suas criaturas, assim também pecamos ou exercitamos as virtudes na criatura sensível de Deus chamada homem. Somos virtuosos ou pecadores no próximo.

Que dizer do texto do Sr. Signorelli? Ele começa criticando os antigos colégios católicos, que ficavam contando as orações, jaculatórias, confissões e comunhões dos alunos. Coisa gravíssima na visão deste senhor. Aliás, a palavra católico é usada só aqui, para consignar a crítica. Católico é mesmo muito retrógrado. Imagina ficar contando oração, jaculatória, confissão e comunhão. O que vale receber Cristo na Eucaristia? Imagina se isso se iguala a “construir a civilização do amor”!!!!

Depois, ele segue falando que “ser cristão não é viver da boca para fora”. Daqui para frente ele fala apenas de cristão, não de católico. Fala ainda que: “Ser cristão é viver como Jesus viveu, amar como Jesus amou ... Os gestos externos ou internos, as orações e jaculatórias, tudo isso não é ponto de partida no relacionamento com Deus. É ponto de chegada.”

Primeiramente, esse senhor parece desconhecer que Jesus orava permanentemente: “Ele saiu para um lugar deserto e se pôs em oração”. Ele rezava com tal freqüência que os discípulos Lhe perguntaram como rezar. E aí Ele lhes ensinou a Oração Dominical. Oração permanente é dever de todo católico, como diz Deus a Santa Catarina. Rezar pelos outros faz parte da caridade católica! Agora, isso de ponto de partida e chegada, eu não me meto, pois não entendi o que o Sr. Signorelli quis nos dizer.

No próximo parágrafo, o Sr. Signorelli nos fala de sua concepção de caridade: devemos acabar com a pobreza do mundo, apenas isso! Para isso, basta ser marxista. É claro que nenhum regime comunista jamais acabou com a pobreza no mundo, muito pelo contrário. Aliás, foi Jesus mesmo Quem disse: “Pobres sempre os terão entre vós”. Reduzindo assim o conceito de caridade, o Sr. Sigorelli, depois de arregaçar as mangas, termina seu artigo com uma frase do famigerado e herético documento de Aparecida: “homens e mulheres da Igreja no mundo e homens e mulheres do mundo na Igreja.”

Bem, todos sabem quem é o príncipe deste mundo! É a ele que o Sr. Signorelli parece adorar.

Termino com uma frase da carta 266 de Santa Catarina a Ristoro Canigiani: “A norma é [da caridade] esta: a pessoa há de estar disposta a entregar a própria vida para a salvação das almas, e a dar os bens materiais para salvar o corpo do próximo.” Não para salvar a sociedade, não para salvar o mundo: para “salvar o corpo do próximo”.

Para ver outros comentários, clique: Parte I, Parte II, Parte III, Parte IV, Parte V, Parte VI, Parte VII, Parte VIII, Parte IX, Parte X

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21/11/2008

Capítulo I. Observações Iniciais sobre a Ortodoxia: Final

Gilbert Keith Chesterton


A teoria da amoralidade na arte se estabeleceu firmemente na classe artística. Eles se sentiram livres para produzir qualquer coisa que desejassem. Estavam livres para escrever “O Paraíso Perdido” em que Satã conquistaria Deus. Podiam escrever a “Divina Comédia” em que o paraíso estaria sob o chão do inferno. E o que fizeram? Será que produziram em sua universalidade algo mais grandioso ou mais belo do que as coisas produzidas pelos gibelinos católicos, por um rígido professor puritano? Sabemos que produziram apenas uns poucos “roundels”.[1] Milton não os vencia somente em sua devoção, ele os vencia na própria irreverência deles. Em todos os seus pequenos livros de versos, você não encontrará um desafiante mais sofisticado de Deus que Satã. Tampouco encontrará a grandeza do paganismo visto pelos ardorosos cristãos que descreveram Faranata balançando a cabeça em puro desdém pelo inferno. E a razão é muito clara. A blasfêmia é um efeito artístico, pois depende de uma convicção filosófica. A blasfêmia depende da crença e está definhando com ela. Se alguém duvida disso, deixe-o sentar calmamente e tentar seriamente ter pensamentos blasfemos sobre Thor. Penso que a família desse sujeito o encontrará exausto ao final do dia.

Nem o mundo da política, nem o da literatura conseguiu ter sucesso com a rejeição das teorias gerais. Pode ser por causa dos ideais equivocados e lunáticos que de tempos em tempos atingem a humanidade. Mas, seguramente, não houve ideal posto em prática mais equivocado e lunático que o ideal da praticidade. Nada perdeu tantas oportunidades que o oportunismo de Lord Rosebery. Ele é, de fato, um símbolo permanente de sua época – o homem que é teoricamente um homem prático, e praticamente mais sem prática do que um teórico. Nada neste universo está tão longe da sabedoria que aquele tipo de adoração da sabedoria mundana. Um homem que está perpetuamente pensando se esta ou aquela raça é mais forte, ou se esta ou aquela causa é mais promissora, é um homem que nunca acreditará em algo por tempo suficiente para fazê-lo prosperar. O político oportunista é como um homem que para de jogar sinuca porque não consegue vencer e que para de jogar golfe porque não consegue vencer. Não há nada mais prejudicial aos propósitos práticos que essa enorme importância dada à vitória imediata. Não há maior fracasso que a vitória.

E tendo descoberto que o oportunismo realmente fracassa, fui induzido a considerá-lo mais detalhadamente e, em conseqüência, a ver que ele tem de fracassar. Percebi que é muito mais prático começar pelo começo e analisar as teorias. Vi que os homens que se matavam pela ortodoxia de Homoousion[2] eram muito mais sensíveis que as pessoas que estão discutindo a Lei da Educação. Pois a dogmática cristã estava tentando estabelecer um reino da santidade e tentando criar uma liberdade religiosa sem tentar definir o que é religião e o que é liberdade. Se os antigos padres impunham um juízo à humanidade, pelo menos se esforçavam previamente para torná-lo lúcido. Sobrou para a moderna turba de anglicanos e não-conformistas a perseguição doutrinária sem nem mesmo defini-la.

Por estas razões, e por muitas mais, eu, por exemplo, cheguei à crença na volta aos fundamentos. Tal é a idéia deste livro. Quero tratar com meus mais distintos contemporâneos, não pessoalmente ou de uma maneira meramente literária, mas em relação ao corpo doutrinário real que eles ensinam. Não estou preocupado com o Sr. Rudyard Kipling como um vívido artista ou uma vigorosa personalidade; estou preocupado com ele como um herege – isto é, um homem cujas idéias das coisas têm a audácia de diferir das minhas. Não estou preocupado com o Sr. Bernard Shaw como o homem vivo mais brilhante e um dos mais honestos; estou preocupado com ele como um herege – isto é, um homem cuja filosofia é muito sólida, muito coerente e muito forte. Volto-me para os métodos doutrinais do século XIII, inspirado pela esperança geral de conseguir alguma coisa.

Suponha que uma grande comoção surja, numa rua, sobre alguma coisa, digamos um poste de iluminação a gás, que muitas pessoas influentes desejam derrubar. Um monge de batina cinza, que é o espírito da Idade Média, começa a fazer algumas considerações sobre o assunto, dizendo à maneira árida da Escolástica: “Consideremos primeiro, meus irmãos, o valor da Luz. Se a Luz for em si mesma boa –”. Nessa altura, ele é, compreensivelmente, derrubado. Todo mundo corre para o poste e o põe abaixo em dez minutos, cumprimentando-se mutuamente em sua praticidade nada medieval. Mas, com o passar do tempo, as coisas não funcionam tão facilmente. Alguns derrubaram o poste porque queriam a luz elétrica; alguns outros, porque queriam o ferro do poste; alguns mais, porque queriam a escuridão, pois, seus objetivos eram maus. Alguns se interessavam pouco pelo poste, outros muito; alguns agiram porque queriam destruir os equipamentos municipais; alguns outros porque queriam destruir alguma coisa. E acontece uma guerra noturna, ninguém sabendo a quem atinge. Então, gradualmente, hoje, amanhã, ou depois de amanhã, forma-se a convicção de que o monge estava certo, afinal, e que tudo depende de qual é a filosofia da Luz. Mas o que podíamos discutir sob o lâmpada a gás, agora temos de discutir no escuro.

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[1] Emblemas nacionais em forma circular. (N. do T.)

[2] Palavra síntese do grande Concílio de Nicéia que significa “da mesma substância de”, é o “consubistantiálem” do Credo de Nicéia. Para lutar contra a insidiosa heresia ariana, “Os católicos afirmaram a integral divindade de Nosso Senhor pelo uso dessa palavra, que implicava que o Filho era da mesma substância Divina que o Pai; que Ele era o mesmo Ser; i.e., Deus”, como diz Belloc, em As Grandes Heresias. (N. do T.)


Ver também Hereges de G.K. Chesterton e Hereges - Capítulo I. Observações Iniciais sobre a Ortodoxia: Parte I, Hereges - Capítulo I. Observações Iniciais sobre a Ortodoxia: Parte II

15/11/2008

Convocação para o abaixo-assinado pela vida

Grupos pró-aborto estão promovendo um abaixo-assinado para que a ONU reconheça o aborto como um suposto direito universal, aproveitando a festa dos 60 anos da promulgação da Declaração Universal dos Diretos Humanos, no dia 10 de dezembro.

Nós, Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, entidades e movimentos em defesa da vida, estamos promovendo outro abaixo-assinado, ou seja, em favor da vida e contra o aborto. Precisamos de 50.000 assinaturas. Convocamos a todos para que divulguem esta nossa campanha a fim de neutralizar um flagrante desrespeito aos direitos humanos.

Faça sua assinatura, defenda a maternidade e a vida inocente votando a favor da dignidade do embrião, do feto e da criança no útero materno. Para isso, acesse:
http://www.c-fam.org/publications/id.101/default.asp

Repasse esta mensagem à sua família, seus amigos, enfim, a todas as pessoas . “Escolhe, pois, a vida” (Dt 30,19).

Brasília, 24 de outubro de 2008.

Dom Dimas Lara Barbosa
Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro Secretário-Geral da CNBB

Dom Orlando Brandes
Arcebispo de Londrina e Presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e Família

08/11/2008

Hereges de G.K. Chesterton

Nota: Apesar de desejar muito continuar a traduzir H. Belloc, começo hoje a tradução de Hereges de G.K. Chesterton. Considero que esta obra é mais importante, neste momento, de ser conhecida do público. Os leitores poderão julgar o acerto ou desacerto desta minha decisão no desenrolar da tradução. De qualquer forma, Chesterton e Belloc eram tão amigos e produziram obras tão afins que George Bernard Shaw os chamava de "monstro biforme Chesterbelloc". Rezem por este pobre tradutor para que ele dê conta do recado.



Fonte da obra
Os direitos autorais deste livro foram registrados em 1905 por John Lane Company. Este texto é o da décima nova edição (1919) publicada pela John Lane Company de Nova York e impressa pela Editora Plimpton de Norwood, Massachusetts. Ele se encontra em domínio público no Brasil.


O autor
Uma das melhores introduções à vida e à obra de Chesterton foi escrita por Ives Gandra da Silva Martins Filho como introdução à Ortodoxia, Editora LTr, São Paulo, 2001. Os leitores podem também consultar o texto de Dale Ahlquist, Quem é esse sujeito, e por que nunca ouvi falar dele?

Tiro do texto de Ives Gandra dois trechos relacionado com a obra Hereges.

Esta obra

“Junto ao ‘Clube dos Negócios Raros’, Chesterton publica em 1905 um livro que cairá como uma bomba nos meios intelectuais ingleses: trata-se de ‘Heretics’, obra em que ataca, com fino humor e numa lógica desconcertante, todos os ídolos literários da época, por considerar que, através deles, está se dando o envenenamento intelectual de toda uma geração. Assim, condena como hereges a George Moore, pelo seu subjetivismo ético, a Bernard Shaw, por seu socialismo desumanizador, a Rudyard Kipling, por seu imperialismo discriminatório, a H.G.Wells, por seu historicismo naturalista [a respeito do qual escreve sua outra obra-prima O Homem Eterno], e a Oscar Wilde , por seu esteticismo aético. Nem os amigos escapam de sua pena, que esgrime, sem ira, a defesa de algo que já começava a delinear em sua mente: uma concepção global do mundo, plasmada numa filosofia ou religião, que norteasse os aspectos díspares destacados pelos vários literatos que combate, por serem reducionistas da realidade, que é muito mais rica do que as teorias por eles propostas. Começa já a falar da ‘teologia geral cristã, que muitos odeiam e poucos estudam’ e que principia a lhe servir de norte para suas meditações.”

A obra Hereges dá, de certa forma, origem a uma das obras-primas de Chesterton: Ortodoxia. Ives Gandra nos lembra que: “Um tal de G.S. Street publica, nesse ano [1908], o livro ‘G.K. Chesterton – Estudo Crítico’, reconhecendo o talento de Chesterton, mas criticando acerbadamente suas obras, ao fundamento de que destruir e atacar todo mundo é fácil, como o fez em ‘Hereges’; difícil mesmo é construir uma visão sólida e coerente do mundo.”

Este tal de G.S. Street ficou famoso às custas de Chesterton, que já na introdução de Ortodoxia diz: “A única desculpa possível para este livro é o fato de ser ele a resposta a um desafio. Um atirador, por pior que seja, torna-se digno de respeito quando aceita um duelo. Quando, há algum tempo, publiquei, sob o título de Hereges, uma série de ensaios, escritos apressadamente porém com sinceridade, alguns críticos, cuja inteligência admiro (refiro-me especialmente ao senhor G.S. Street), declararam que eu incitava todos a tornarem públicas suas teorias sobre os problemas cósmicos, mas evitava, cautelosamente, apoiar meus preceitos com o exemplo. ‘Começarei a me inquietar com minha filosofia’ – disse, nessa ocasião, o senhor Street – ‘quando o senhor Chesterton nos tiver apresentado a sua’. Era, talvez, uma imprudente sugestão feita a quem está sempre preparado para escrever um livro à mais leve provocação.”

O livro Ortodoxia teve um destino, no Brasil, mais feliz que Hereges, tendo merecido por aqui algumas traduções, a última das quais em 2008, pela Editora Mundo Cristão, em comemoração ao centenário da obra.

Hereges, pelo que sei, ainda não foi traduzido para o português, tarefa a que, temerariamente, me lanço agora neste blog. Tarefa temerária pela dificuldade de se traduzir Chesterton e pela modesta capacidade do tradutor. Mas como ninguém mais bem preparado apareceu, sobrou para mim o preenchimento desta lacuna indesculpável da ausência deste livro em nossa língua pátria.


Sumário da obra

1. Observações Iniciais sobre a Importância da Ortodoxia
2. Sobre o Espírito Negativista.
3. Sobre o sr. Rudyard Kipling e Fazendo o Mundo Pequeno
4. O sr. Bernard Shaw
5. O sr. H. G. Wells e os Gigantes
6. O Natal e os Estetas
7. Omar e o Vinho Sagrado
8. A Delicadeza da Imprensa Amarela
9. O Temperamento do sr. George Moore
10. Sobre Sandálias e Simplicidade
11. A Ciência e os Selvagens
12. O Paganismo e o sr. Lowes Dickinson
13. Os celtas e os Celtófilos
14. Sobre Certos Escritores Modernos e a Instituição da Família
15. Sobre Novelistas Inteligentes
16. Sobre o sr. McCabe e a Divina Frivolidade
17. Sobre o Wit of Whistler
18. A Falácia da Jovem Nação
19. Novelistas de Cortiço e os Cortiços
20. Observações Finais sobre a Importância da Ortodoxia

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Ver Hereges, de Chesterton, será publicado em português, pela primeira vez.

31/10/2008

Sobre o que dizem os dicionários

Dia desses um colega me passou o link do dicionário Aulete Digital, supostamente o sucessor do Caldas Aulete, um dicionário legendário no Brasil, editado até a década de 1980, como nos informa o link do Aulete Digital.

A versão digital do famoso dicionário é uma “construção coletiva”. Quem quiser pode colaborar. Os parceiros principais são o Estado de São Paulo e a Rede Globo de Televisão, que “têm na língua seu instrumento de comunicação, e que representam um universo de seu uso real em praticamente todos os setores da vida contemporânea, no Brasil e no mundo”, segundo dizem.
Quando vejo coisa assim sempre desconfio. Essa tal de construção coletiva é normalmente um palavrório bonitinho para nos enganar. É como a história do software livre, cujos idealizadores gostam mesmo é de mamar em verbas governamentais.

Mas será que tem dinheiro nosso no tal dicionário coletivo? Vejam lá os patrocinadores: Ministério da Cultura (Lei de Incentivo à Cultura), CEMIG e Petrobrás, dentre outros. Nosso rico dinheirinho está indo embora.

Por trás da coisa toda está a Lexikon Editora Digital que faz apologia da Lei Rouanet e, acreditem, oferece por meio de um link, um vídeo de Gilberto Gil. Que doçura, não é?!
Fui dar uma olhada nos verbetes. Escolhi para começar “comunismo” e já bastou para ver que construção coletiva é essa que suga nosso dinheiro. Vejam o que encontramos no dicionário:

(co.mu.nis.mo)
sm.
1. Econ. Pol. - Sistema e ideologia política, social e econômica que se baseiam na propriedade coletiva e propõem-se a distribuir os bens segundo as necessidades individuais e a abolir as classes sociais
2. Pol. - O conjunto dos comunistas e sua atividade política
3 Qualquer grupo coletivo em que os bens são divididos segundo a necessidade de cada um.

[F.: comun (i)- + -ismo]
Comunismo primitivo
1. Hist. Econ. Pol. - Sistema de organização social da Idade da Pedra, no qual a propriedade dos meios de produção (relativos à caça, á coleta e a uma agricultura primitiva) eram coletivos, e os produtos divididos entre todos os membros da coletividade.

Viram que coisa mais delicada. Comunismo para o Aulete Digital é um sistema político que propõe distribuir os bens segundo as necessidades de cada um. Se não conhecemos a respeito dos cem milhões de mortos do comunismo, ainda assim, para preservar um pouco de lógica, deveríamos perguntar à tal construção coletiva, como é que o “sistema político” ficaria sabendo sobre minhas necessidades ou as suas leitor amigo. Poderíamos perguntar também se onde foi implantado tão nobre sistema as coisas funcionaram bem.

Mas o melhor vem depois, quando o dicionário define um “comunismo primitivo”. Veja bem, se você pensava que o comunismo foi uma criação de alguns desequilibrados, na melhor das hipóteses, lá pelo século XIX, você está redondamente enganado. Na Idade da Pedra, todos éramos comunistas.

Isso é tão estapafúrdio que chega a ser cômico. A tal construção coletiva não percebeu que há uma relação entre o comunismo e a Idade da Pedra, mas não é essa que está no dicionário. A relação verdadeira é que toda comunidade que adota esse sistema político volta para a Idade da Pedra. Esta sim é a relação correta entre os dois termos.

Aqui me ocorre uma passagem do livro de Luis Pazos, Lógica Econômica, em que ele diz:

“Alguns pensadores, entre eles Marx e Engels, criaram a dúvida, em muitos legisladores, políticos e estudiosos das ciências sociais, sobre a legitimidade da propriedade. Partiram da premissa de que o oferecido pela natureza é de todos e a apropriação de terras e de bens é um ato arbitrário. A partir dessa idéia se concluiu que se a propriedade era, originalmente, ilegítima, os governantes tinham o direito de apoderar-se dela e redistribuí-la com um critério mais justo.

“A origem da propriedade é muito anterior à época em que o homem se torna sedentário e começa a cercar pedaços de terra. A propriedade é uma atitude racional a respeito dos bens que nos rodeiam. Normalmente, o ser humano descobre ou acrescenta uma utilidade aos bens naturais, mediante sua transformação ou transporte.

“O ser humano, na maior parte da história - talvez, excetuando-se a época da coleta de frutos -, tem utilizado a razão para reunir as coisas que o satisfaça. Na medida em que o ser humano progride, é menor a proporção do consumo de bens oferecidos espontaneamente pela natureza e prontos para serem consumidos.

“O erro dos marxistas, como assinala Eudocio Ravines, que foi marxista durante grande parte de sua vida, estava em situar a origem da propriedade numa época histórica caracterizada pelos 'cercamentos' ou pela repartição de terras.

“A primeira manifestação social da propriedade não está em cercar um terreno, como pensavam Engels e Marx, mas na fabricação de ferramentas, desde o alvorecer da humanidade, como demonstram os restos do chamado Homo habilis, que datam de um milhão e oitocentos mil anos atrás.”

Veja que é a origem da propriedade que está na pré-história do homem e não a do comunismo.
Depois disso, fechei o programa e desisti de usar essa “maravilhosa” construção coletiva para qual, pelo jeito, vou continuar colaborando com meu imposto de renda. Talvez seja esta a “necessidade” que o sistema descobriu que tenho.

26/10/2008

Aos leitores do blog

A Editora Permanência vai publicar a tradução de "As Grandes Heresias", de Hilaire Belloc, que tenho publicado aqui ao longo de muito tempo. A primeira estimativa é que a publicação já esteja disponível no primeiro semestre de 2009. O livro contará com um prefácio de Dom Lourenço Fleishman.

Uma conseqüência disso é que as traduções que já estão publicadas serão retiradas deste blog dentro de uma semana. A outra conseqüência é que não serão publicadas novas traduções.

Sei que isso é uma pena para o leitor do blog, mas é muito bom que uma editora verdadeiramente católica se interesse em publicar livro tão importante.

Para compensar os leitores, assim que puder, vou começar nova série de traduções de Belloc. Estou planejando traduzir "The Servile State", um livro de teoria econômica na perspectiva católica.

19/10/2008

No mês do Rosário, o papa do Rosário

No mês do Rosário, com indesculpável atraso, publico o link das Encíclicas marianas de Leão XIII, o papa do Rosário. Estão todas em português.

Adiutricem Populi
Augustissimae Virginis Mariae
Diuturni Temporis
Fidentem Piumque Animum
Iucunda Semper Expectatione
Laetitiae Sanctae
Magnae Dei Matris
Octobri Mense
Superiore Anno
Supremi Apostolatus



Que a Virgem Maria nos abençoe neste vale de lágrimas e nos recomende ao seu Augusto Filho!

05/10/2008

Juros: Böhm-Bawerk, Ludwig von Mises e Santa Catarina de Sena

A Igreja Católica, como todos sabem, sempre condenou a usura (cobrança de altos juros, agiotagem). Atualmente, a Igreja não proíbe o empréstimo a juros, se estes forem estipulados em valores razoáveis. No entanto, a cobrança de juros razoáveis, apesar de não atentar contra a justiça, pode atentar contra o que a caridade aconselha. E como todos sabem, a caridade é uma virtude teologal, enquanto a justiça é uma virtude cardeal.

Mas, não só a Igreja, mas “os velhos pagãos gregos, os judeus do Antigo Testamento e os grandes mestres cristãos da Idade Média. (...) Todas essas pessoas nos recomendavam unanimemente que não emprestássemos dinheiro a juros; no entanto, emprestar dinheiro a juros – aquilo a que damos o nome de ‘investimento’ – é a própria base de todo o nosso sistema econômico. (...) Três grandes civilizações [grega, romana e medieval] estiveram de acordo – ou pelo menos assim parece, à primeira vista -- em condenar precisamente aquilo em que baseamos toda a nossa vida econômica.” (C.S.Lewis, Mero Cristianismo)


A resposta a essa observação de Lewis é mais ou menos a seguinte: “Numa economia estática como a ordem feudal, ou mais ainda na sociedade escravista do tempo de Aristóteles, o dinheiro, de fato, não funciona como força produtiva, mas apenas como um atestado de direito a uma certa quantidade genérica de bens que, se vão para o bolso de um, saem do bolso de outro. Aí a concentração de dinheiro nas mãos do usurário só serve mesmo para lhe dar meios cada vez mais eficazes de sacanear o próximo. Mas pelo menos do século XVIII em diante, e sobretudo no XIX, o mundo europeu já vivia numa economia em desenvolvimento acelerado, onde a função do dinheiro tinha mudado.” (Capitalismo e Cristianismo, Olavo de Carvalho)

Parece-me que é exatamente pelo que Olavo de Carvalho observa que a Igreja evolui de uma posição de condenação dos juros para a condenação da usura.

Um detalhe interessante da história econômica se relaciona com a evolução do entendimento do homem do que sejam os juros. Tem-se como certo de que foi von Mises, aluno de Böhm-Bawerk, que nos explicou o que era de fato os juros, a que esse preço da economia se relacionava: quem cobra juros vende tempo: “o direito à remuneração provém de que o banqueiro não troca simplesmente uma riqueza por outra, mas troca riqueza em ato por riqueza em potência”. (Capitalismo e Cristianismo, Olavo de Carvalho) Ou seja, supostamente ninguém antes de von Mises tinha “sacado” o verdadeiro significado dos juros, o que dá ao economista austríaco um confortável lugar no panteão dos pioneiros.

Bem eu descobri (não, não devo ter sido pioneiro nisso!) recentemente que, se não estou completamente enganado, a idéia do fator tempo no significado dos juros já era velha de pelo menos 6 séculos quando von Mises a “redescobriu”. Santa Catarina de Sena, em O Diálogo (14.2), descreve Deus lhe dizendo o seguinte: “Outros pecados ficam nos bens materiais, como nos avarentos e gananciosos. Estes fazem como as toupeiras, que se alimentam de terra até à morte. Só que estes pecadores, ao chegar o dia da morte, já não têm mais cura. Gananciosos, eles negociam o tempo, são usurários, cruéis, ladrões. Sua memória se esquece dos meus benefícios. Em caso contrário, deixariam de ser cruéis consigo mesmos e com os outros. De si mesmos teriam pena, praticando as virtudes; dos outros, pelo serviço da caridade. (...) Ele [o pecador] mata a alma, torna-a escrava dos bens materiais, negligente em observar os meus mandamentos. O ganancioso-avarento não ama ninguém, a não ser por interesse próprio.” [Negritos meus]

Aí está, em pleno século XIV, a santa, e doutora da Igreja, dizendo que os gananciosos (usurários) “negociam o tempo”, adiantando assim, é o que me parece, o grande achado do economista austríaco.

Mas Deus adianta ainda mais. O que O preocupa não é a eficiência econômica, da qual a cobrança de juros (altos ou baixos) é uma parte importante, “base de nossa vida econômica”, como nos lembra Lewis. Deus quer salvar as almas que ele criou. Ele parece pensar que a ganância (mesmo que promovendo a eficiência econômica) depõe contra a salvação das almas: “o pecador [usurário] mata a alma”. Já dizia São Paulo, muito antes de Santa Catarina, que muitas coisas nos são possíveis, mas apenas algumas recomendáveis. Parece ser este o caso.

Talvez seja interessante ler o que a Enciclopédia Católica nos diz dos juros e da usura.

27/09/2008

O diabo da Veja e o nosso

A revista Veja, em sua edição 2078, de 17 de setembro de 2008, publica uma resenha de dois livros que tratam do tema do diabo, Anjos Caídos e Satã. O resenhista é Jerônimo Teixeira.

Não li nenhum dos dois livros e nem irei lê-los, pois tenho mais o que fazer. Mas chamam a atenção na resenha algumas afirmações. Se elas são do sr. Jerônimo ou dos autores dos livros, não fica claro no texto.

Uma observação inicial é a de que há uma superficialidade insuportável na resenha. Tal como em outra resenha que comentei aqui (O mal, os católicos e a Veja), parece que atualmente os resenhistas têm muito pouco interesse em se aprofundar no tema do livro que eles comentam. As obras que o sr. Jerônimo cita, além da que ele comenta, para dar um sabor de erudição ao seu texto são “Legenda Áurea” e “Fausto”. A referência à “Legenda Áurea” mostra que tipo de conhecimento tem o resenhista, pois qualquer católico minimamente informado sabe que a obra é totalmente condenável por ser inverídica[1]. Ele ainda cita uma referência de Charles Baudelaire ao diabo. No mais, o sr. Jerônimo tenta fazer o diabo parecer um ser absolutamente ridículo.

Aqui lembro-me de Bernanos em seu “Diário de um Pároco de Aldeia”, quando o pároco diz: “Pois Satã é um amo muito rígido: ele não ordenaria, como o Outro, com sua simplicidade divina: ‘Imitem-me!’ Ele não suporta que suas vítimas se assemelhem a ele, permite-lhes apenas uma caricatura grosseira, impotente, com a qual deve se deliciar, sem jamais se saciar, a feroz ironia do abismo.” Lembro também da advertência inicial que C.S. Lewis faz em seu “Cartas de um Diabo a seu Aprendiz”: “Há dois erros semelhantes mas opostos que os seres humanos podem cometer quanto aos demônios. Um é não acreditar em sua existência. O outro é acreditar que eles existem e sentir um interesse excessivo e pouco saudável por eles. Os próprios demônios ficam igualmente satisfeitos com ambos os erros, e saúdam o materialista e o mago com a mesma alegria.” Faria muito bem ao sr. Jerônimo ler tanto o livro de Bernanos quanto o de Lewis.

Comentemos pois a resenha, no que ela tem de mais significativo. A primeira frase que chama a atenção é: “No cômputo final, Satanás é quase como um figurante na Bíblia. Sua aparição”. A outra, semelhante a essa é: “A narrativa cristã da perdição e da redenção do homem quase poderia prescindir do Coisa-Ruim.” Notem, primeiramente, que satanás e coisa-ruim são escritos com letra maiúscula e redenção com minúscula. Daí se vê que o sr. Jerônimo não entende bem as coisas que comenta. Não entende que a Redenção só foi necessária por causa da Queda, que teve participação direta da serpente, que outra coisa não é que satanás.

Com relação à posição bíblica de figurante de satanás, vamos clarear um pouco as coisas. Primeiramente, nós católicos, somos os primeiros a admitir que as referências bíblicas a satanás não são numerosas. Mas elas são muito significativas. Vejamos algumas:

“Como caíste do céu,
ó astro brilhante, que, ao nascer
do dia, brilhavas?
Como caíste por terra, tu que ferias as nações?
Que dizias no teu coração: Subirei
ao céu,
estabelecerei o meu trono acima dos astros de Deus,
sentar-me-ei sobre o monte da aliança,
(situado) aos lados do aquilão.
Sobrepujarei a altura das nuvens,
Serei semelhante ao Altíssimo.
E contudo foste precipitado no inferno,
Até ao mais profundo dos abismos.” (Is 14:12-15)

“Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, que foi preparado para o demônio e para os seus anjos”. (Mt 25:41)

“Eu via satanás cair do céu como um raio.”(Lc 10:18)

“Houve no céu uma grande batalha: Miguel e os seus anjos pelejavam contra o dragão, e o dragão com os seus anjos pelejava contra ele; porém estes não prevaleceram, nem o seu lugar se encontrou mais no céu. Foi precipitado aquele grande dragão, aquela antiga serpente, que se chama demônio e satanás, que seduz todo o mundo, foi precipitado na terra, e foram precipitados como ele os seus anjos.” (Ap 12:7-9)

Somam-se a essas, as narrativas dos três Evangelhos sinóticos sobre as tentações de Nosso Senhor Jesus Cristo pelo demônio. Sobre elas há um comentário belíssimo de Bento XVI em seu livro “Jesus de Nazaré”.

Essas (e outras) poucas referências bíblicas são a palavra da Sagradas Escrituras. Para nós, católicos, além das Sagradas Escrituras, há também a Tradição da Igreja. E aí há muitíssimas referências ao diabo, da Patrística latina e grega, de vários grandes teólogos, dos Concílios e dos Papas.

Há assim uma riqueza imensa de comentários sobre a natureza do pecado dos anjos rebeldes e de sua rebelião contra Deus.

O Concílio que definiu o dogma referente ao demônio foi o IV Concílio Laterano de 1215: “Diabolus enim et alii dæmones a Deo quidem naturâ creati sunt boni, sed ipsi per se facti sunt mali.” [O diabo e os outros demônios foram criados por Deus naturalmente bons, mas por si mesmos se tornaram maus.]

Que o diabo tenha a natureza angélica, que ele tenha sido criado bom e se rebelado por orgulho encerra um grande ensinamento para nós católicos: o grande pecado contra Deus é o orgulho ou soberba. É ele que pode nos levar aos infernos e é em direção a ele que o demônio nos empurra. Por isso, a primeira das bem-aventuranças é: “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus”. Os ricos de espírito são os orgulhosos e: “Ai de vós ricos, porque recebestes já a consolação.”

Depois de tudo isso, o sr. Jerônimo termina sua resenha, dando razão a Baudelaire “que observou que o maior truque do Diabo é nos convencer de que ele não existe.” O resenhista conclui: “Faz sentido: é só dar-lhe um pouco de atenção, para o Diabo se tornar uma figurinha ridícula.” Quem escreve diabo com letra maiúscula, protocolando-o o maior respeito, e depois o chama de figurinha ridícula ou perdeu o juízo ou quer brincar com fogo.

Nós católicos queremos a maior distância do diabo, pois sabemos que ele é mau e muito mais poderoso que nós humanos. Por isso rezamos pedindo a proteção dos santos, da Virgem Maria, nossa grande protetora contra o demônio e do Altíssimo Jesus Cristo que, quando entre nós, expulsou muitos demônios que atentavam os seres humanos e em nome de quem é feito o exorcismo católico.

Quem se interessar pelo assunto “demônio” pode consultar a Enciclopédia Católica sobre Demônio e Demonologia.

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[1] Ver, por exemplo, o verbete Beato Jacopo de Veragine, da Enciclopédia Católica.

07/09/2008

Teresa de Frei Beto, não Santa Teresa de Ávila

Frei Beto, em artigo de jornal semana passada (tive o desprazer de ler o artigo no Estado de Minas de 04/09/2008), cria um personagem chamado Teresa que ele tenta fazer parecer com a grande santa e doutora da Igreja.

A personagem é uma revolucionária anti-paulina. Afrontou e venceu a maldosa inquisição e finalmente deixou um legado de libertação. Isso tudo ele descobriu em Bananeiras (PB), num convento das Carmelitas Descalças, que teve a desventura de receber esse herege para pregar um retiro.

Ele comenta que “Entre 1558 e 1560 seis teólogos a mantiveram sob observação, prontos a desmascarar o demônio que estaria por trás da espiritualidade dela ...” Isso é verdade e demonstra todo o cuidado que a Igreja tinha em se certificar da procedência dos fenômenos espirituais. Isso se chama exercitar o “discernimento dos espíritos”, conceito, por ironia, paulino e que é uma das coisas preciosas que a Igreja mantém. Aliás, para os leitores desse blog, vai aí uma sugestão de leitura muito interessante sobre assunto: Mystical Phenomena Compared with Their Human and Diabolical Counterfeits. Desnecessário dizer que esse frei nunca leu tal livro. Se ele o tivesse lido, veria que era obrigação da Igreja ter o cuidado que teve com Teresa.

Mas notemos as reticências ao final da frase de frei Beto. Não posso deixar de escutar o riso de sarcasmo desse frei: “esses teólogos medievais que ainda acreditavam no demônio! Que coisa mais ultrapassada!” Claro, os modernistas hereges não acreditam no demônio ou, no máximo, acham que isso é apenas uma metáfora.

O frei cita também várias passagens do livro “Vida” da santa Teresa de Ávila, onde ela comenta sobre as suspeitas da Igreja a respeito de seus relatos espirituais. Esse livro foi escrito por imposição da Igreja e se destinava somente aos teólogos que estavam analisando o “caso” de Teresa. Daí se vê, de antemão, como era revolucionária essa santa: a Igreja mandava e ela ... obedecia!!!!

Mas será que a grande santa e doutora da Igreja obedecia cegamente, como aqueles medievais retrógrados? Vejamos o que diz santa Teresa sobre suas experiências místicas:
“Pois em começando a fugir das ocasiões e a dar-me mais à oração, começou o Senhor a fazer-me as mercês como quem desejava – segundo parecia – que eu as quisesse receber. Começou Sua Majestade a dar-me, muito de ordinário, oração de quietude e muitas vezes a de união que durava muito tempo. Como nesses tempos tinha acontecido haver grandes ilusões em mulheres e enganos a que as tinha levado o demônio, comecei a temer, pois era tão grande o deleite e a suavidade que sentia, e muitas vezes sem o poder evitar, ainda que por outra parte, visse em mim uma grande segurança de que aquilo era Deus, em especial quando estava em oração, e que saía dela muito melhorada e com mais fortaleza. Mas, em me distraindo um pouco, tornava a temer e a pensar se o demônio quereria – fazendo entender que aquilo era bom – suspender-me o entendimento para me tirar a oração mental e não pudesse pensar na Paixão nem me aproveitar do entendimento. Isto me parecia a mim maior perda, pois não o compreendia.” (Vida, XXIII, 2)

A grande santa acreditava no demônio, ao contrário dos modernistas. A grande santa tinha também dúvidas. Mas, quem não as teria? Maria, quando ouviu as palavras do anjo na Anunciação “perturbou-se e discorria pensativa que saudação seria esta.” (Lc. 1, 29.) Se mesmo a Virgem Santíssima, ao ver o anjo, perturbou-se, quem ao ter as experiências que teve Teresa não duvidaria? Mas o que fez Teresa, então? Vamos deixar que ela nos conte: “Mas como sua Majestade já me queria dar luz para que não O ofendesse e conhecesse o muito que Lhe devia, cresceu este medo de tal sorte que me fez buscar com diligência pessoas espirituais com quem tratar.” (Vida, XXIII, 3) Vê-se então que Teresa procurou ajuda, porque o Senhor fez o medo dela crescer! E ela procurou ajuda na Companhia de Jesus, como ela narra no livro.

Contada assim, a história fica sendo bem outra. A Igreja se preocupou com a experiência mística de Teresa tanto quanto ela própria se preocupou. Teresa morreu em 1582 e foi canonizada em 1614. Um tempo relativamente curto para a época. Isso mostra o reconhecimento da Igreja, depois de muito analisar, sobre a origem divina da experiência de Teresa. A propósito, o frei diz, no artigo, que Teresa “transvivenciou” em 1582. A morte para o frei é “transvivenciar”. O meu Word está reclamando dessa palavra e meu Aurélio não registra tal verbete. Isso é coisa de revolucionário que tem medo da morte! E deve tê-lo mesmo! Vocês já imaginaram a expressão: Jesus transvivenciou na cruz!

A Teresa de Ávila foi, ao longo de sua vida, completamente submissa à Igreja, obediente em tudo à Esposa de Cristo. A Teresa do frei era revolucionária. E mais, anti-paulina. São Paulo, em (1Cor. 14, 34-35), diz (cito como aparece no artigo): “As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja”. Daí o frei diz “que Paulo VI [o grande papa dos modernistas] ousou discordar do apóstolo e proclamar Teresa ‘doutora da Igreja’. Militante da fé, reformadora e fundadora, ela não se calou na Igreja e lutou em prol da liberdade religiosa das contemplativas e se assumiu com mestra espiritual.”

Quem lê isso pode pensar que Teresa de Ávila celebrava missa, ou fazia leituras lá do altar, como fazem os atuais “ministros da eucaristia”. Nada disso aconteceu! Ela foi muitíssimo paulina. Citava o apóstolo constantemente em seus escritos. Quanto a ser uma lutadora pela liberdade religiosa, isso ela foi: liberdade de ser católica, de ser enclausurada, de ser monja carmelita! Lutar pela liberdade religiosa naquela época, na acepção modernista do frei, teria sido ser ecumênica, ou seja, dizer, como dizem os modernistas, que há salvação fora da Igreja católica. Se Teresa tivesse dito isso ela não teria sido santa, mas sim herege.

O frei deixa o melhor para o final do artigo, quando diz: “A grande revolução operada por Teresa na espiritualidade foi justamente inverter os pólos: não são os nossos méritos que nos tornam mais próximos de Deus, e sim nossa capacidade de nos fazer mais próximos de nossos semelhantes e nos abrir ao amor gratuito de Deus.”

O frei não se satisfaz com a revolução marxista que ele ajudou a fazer em Cuba e com a que ele está ajudando a fazer aqui no Brasil. Ele quer mais; ele quer uma revolução na espiritualidade também! Quanto aos pólos que foram supostamente invertidos, que católico antes de Teresa afirmava que nossos méritos é que nos tornam mais próximos de Deus? Que católico antes e depois de Teresa, católico digno do nome, não acredita que a Graça de Deus sopra onde quer? Meu Deus! De que catolicismo esse frei está nos falando? Para citar só um exemplo anterior a Teresa, e só para ficar com outra doutora da Igreja, santa com a Graça dos estigmas, que também tinha experiências místicas fenomenais, vou citar Santa Catarina de Sena. Ela diz ter ouvido de Deus o seguinte (O Diálogo, 2.5): “Vou explicar-lhe agora que toda virtude se realiza no próximo, bem com todo o pecado. (...) Todo e qualquer auxílio prestado ao próximo deve provir do amor que se tem por aquela pessoa, mas como conseqüência do amor que se tem por mim. Da mesma forma, todo mal se realiza no próximo, e quem não me ama, também não tem amor pelos outros.” O inferno PODE ser os outros, como não disse Sartre!!!!

Para terminar vou contar a esse frei enganador quem é que fez a tal revolução espiritual que ele procura em Santa Teresa. Ele ainda não percebeu quem foi o grande revolucionário espiritual, para usar as palavras dele. Isso acontece porque ele não é católico, porque se afastou de Deus. E quem se afasta de Deus, perde, pouco a pouco, as faculdades da alma, que, segundo Santa Catarina de Sena, são a memória, a inteligência e a vontade. Mas o revolucionário espiritual procurado foi Jesus de Nazaré. E qual sua credencial de revolucionário? Obediência ao Pai até a Sua morte no madeiro, por amor a nós. Nos amou por causa do Pai e em obediência a Ele!

05/09/2008

Ann Coulter sobre Sarah Palin: O melhor deles era uma mulher

Ann Coulter em seu artigo no Townhall é como sempre brilhante nos comentários sobre a vice na chapa de John McCain. O título se refere ao fato de que a lista de candidatos a candidato a vice de McCain era composta principalmente de homens.

Não tenho autorização para traduzir o artigo, por isso não vou fazê-lo, mas traduzo duas pérolas.

Primeira frase do artigo: “A escolha de Sarah Palin, governadora do Alaska, por John McCain finalmente deu motivos aos republicanos para votarem nele – isto é, uma razão além de B. Hussein Obama.” Note como Ann Coulter se refere a Obama!

Sobre as críticas dos esquerdistas a respeito de uma mulher com cinco filhos concorrer à vice-presidência e também sobre sua filha de 17 anos estar grávida e não ser casada: “Quando os esquerdistas começam a agir como se eles se opusessem ao sexo antes do casamento e que mães tenham suas próprias carreiras, tem-se logo a certeza que a escolha de McCain foi um chute na canela deles. Mas, pelo menos, os jornalistas esquerdistas acharam alguém do tamanho deles para brigar: uma garota de 17 anos.”