29/06/2009

Contra Impugnantes comenta a revista CP Filosofia no. 18

O excelente blog anti-liberal Contra Impugnantes, de Carlos Nougué e Sidney Silveira, tece breve comentário sobre os artigos deste número da revista. Vale a pena dar uma olhada, principalmente quem ainda não comprou a revista.

27/06/2009

Nelson, Chesterton e as escolas católicas

Há toda uma gama de conseqüências da crise da Igreja após o Concílio Vaticano II. A derrocada das escolas católicas talvez tenha sido a conseqüência mais deletéria, pois tem efeitos duradouros de difícil reversão. A seguir, os leitores poderão ler dois textos, um de Nelson Rodrigues e outro de Chesterton. Nelson comenta o fechamento do Colégio Sion de Petrópolis e Chesterton fala sobre a necessidade de uma educação católica e de como ela se daria no mundo moderno.

Já não existem, ou existem muito poucas, escolas católicas no Brasil. Esta crise não é só local. Acabamos de ver, algumas semanas atrás, o Sr. B. Hussein Obama, comunista árabe, abordista e presidente dos EUA, receber um título da Universidade de Notre Dame, Universidade de Nossa Senhora. Meu Deus! Que blasfêmia! De nossas PUC’s, [PUC=Pontifícia Universidade Católica] nem se fala. São antros de abortistas, gaysistas, comunistas etc. Quem quiser entender como o Concílio Vaticano II atingiu de forma destruidora as escolas católicas, leia o capítulo XII, do Iota Unum, livro de Romano Amerio.

Mas vamos aos textos, primeiro o de Nelson, depois o de Chesterton.


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Colégio Religioso
Nelson Rodrigues


Esquecia-me de explicar que seu [de uma das grã-finas, personagens constantes nas crônicas de Nelson] telefonema tinha um motivo: o recente artigo de Gustavo Corção. O pensador católico escrevera, exatamente, sobre o espantoso fechamento de colégios religiosos. Não sei se vocês tomaram conhecimento do artigo. Ai de nós, ai de nós. Somos, e cada vez mais, leitores ineptos, relapsos. O Brasil está cheio de coisas que devem ser ditas. Corção é, precisamente, um dos nossos autores vitais. Não esperem do seu espírito nenhum silencia vil. E a minha conhecida estava, com todas as forças de sua alma, ao lado de Corção.

Já chorando, ia explicando. Fechou-se o “Sion” de Petrópolis, sob a alegação de prejuízo. Era mentira ou, se quiserem, uma falsa verdade, uma verdade violentada. O que houve é que, lá, o ensino religioso se aviltou de tal forma que as famílias católicas entraram em pânico mais profundo e justificado. Os pais foram, pouco a pouco, retirando as suas filhas. Preferiam matriculá-las no “Pedro II”, por exemplo, certos de que, neste, não se agride o sentimento religioso de ninguém. Numa palavra – O “Pedro II” merecia, sim, a confiança de qualquer pai católico.

Portanto, as autoras de toda a decadência do “Sion” de Petrópolis eram as freiras “pra frente”, as “moderninhas”, exiladas de Deus. Claro que nem todas são assim. Mas as autênticas eram logo isoladas e vencidas. Fechou-se o “Sion” e que aconteceu com as freiras de verdade? Foram amontoadas num sítio, não sei onde. É uma espécie de campo de concentração de freiras que o são de verdade e, portanto, tidas como irrecuperáveis.

A minha conhecida despediu-se com o apelo: – “Escreva, escreva!” No dia seguinte, ou dois dias depois, sou procurado na redação. Um senhor de seus 50 anos, bem vestido. Mas isso não importa. Importa é o que ele disse. Era pai de uma menina que tinha sido do “Sion” daqui. Começou assim: – “Quero dizer que o Corção está certo, certíssimo. E achei admirável que dissesse o nome do colégio. O nome do colégio era vital.”

O visitante contou-me um episódio recente. Tudo acontecera no tempo das passeatas. Hoje, temos a sensação de que as passeatas são mais antigas do que a primeira Batalha do Marne, mais antigas do que o último Baile da Ilha Fiscal. E quando havia uma, era uma festa para as freiras “moderninhas”. Acontecia esta coisa prodigiosa: – elas, que andavam de minissaia, só punham o hábito para ir à passeata. Vocês se lembram daquela dos “100 mil”. Dos “100 mil” ou outra qualquer. O fato é que, como se tratava de passeata, as freiras vestiram-se de freiras. E uma delas, professora, passou na aula e chamou uma das alunas: – “Você vai tomar conta da turma.” Largou a classe e foi, excitadíssima, com outras, para a passeata. Como pouco mais, desfilava na Avenida, dando adeusinhos para as sacadas ou entrando no coro: – “Participação, participação, participação!” Das sacadas, choviam as listas telefônicas e os cinzeiros. Depois, veio a palavra de ordem: – “Vamos sentar, pessoal.” Todos sentaram-se, inclusive as freiras “moderninhas”. Era a primeira passeata sentada, na história do homem.

E as alunas abandonadas? Mal a freira saiu, muito esfuziante e pateta, a menina incumbida de tomar conta das outras avisou: – “Não tomo conta de ninguém. Vocês façam o que quiserem.” E foi uma gritaria infernal. Súbito, entra lá uma outra professora, furiosa. Silêncio. E a professora, esganiçada: – “Quem é a responsável por esta bagunça?” Resposta fulminante da menina encarregada: – “A responsável é aquela irresponsável que foi pra farra!” Fim da história. E pergunta o pai da ex-aluna do “Sion”: – “O senhor compreende, agora, por que se fecham os colégios religiosos?” Fui levar o meu visitante até à porta. Ele saiu. Exalava uma cava depressão.

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Novos argumentos a favor das escolas católicas

Gilbert Keith Chesterton


Não há nada particularmente meritório em ser moderno. Um homem que seriamente descreve seu credo como modernismo poderia, da mesma forma, inventar um credo chamado “segunda-feirismo”, querendo dizer que ele tem uma fé especial a tudo que lhe acontece nas segundas-feiras; ou um credo chamado “manhanismo”, querendo dizer que ele acredita nas idéias que lhe ocorrem nas manhãs, mas não nas tardes.

A modernidade é apenas o momento em que por acaso nos encontramos, e ninguém que pensa considerará isso superior tanto em relação ao tempo posterior quanto ao antecedente. Mas, num sentindo relativo e racional, podemos nos congratular por sabermos das novidades do momento, por termos percebido os fatos e descobertas recentes que algumas pessoas ainda ignoram.

E é neste sentido que podemos verdadeiramente chamar de um fato científico, e especialmente psicológico, o conceito fundamental da educação católica. Nossa demanda por uma cultura completa, baseada em sua própria filosofia e religião, é uma demanda que não encontra resposta à luz da mais vital, e mais moderna, psicologia. Quanto a isso, para aqueles que se preocupam com tais coisas, dificilmente haverá uma palavra mais moderna que atmosfera.

Ora, contanto que estejam engajados em algo diferente de uma discussão conosco, nossos amigos modernos e científicos nunca se cansam de nos dizer que a educação deve ser tratada como um todo; que todas as partes da mente se afetam mutuamente; que nada é trivial demais para não ser significante ou mesmo simbólico; que todos os pensamentos podem ser “coloridos” por emoções conscientes ou inconscientes; que o conhecimento nunca pode ser colocado em compartimentos estanques; que o que parece um detalhe desprezível pode ser o símbolo de um desejo profundo; que nada é negativo, nada está a descoberto, que nada permanece separado, isolado.

Eles usam esses argumentos para todo o tipo de propósitos, alguns deles lógicos, alguns quase insanamente tolos; mas é assim, em geral, como eles agem. E uma coisa que eles não sabem é que estão argumentando a favor da educação católica, e especialmente a favor da atmosfera católica nas escolas católicas. Se soubessem, talvez desistissem de seus argumentos.

De fato, aqueles que recusam a entender que uma criança católica deve ter uma escola completamente católica vivem naqueles velhos tempos, velhos e maus tempos, em que ninguém queria educação, mas somente instrução. Eles são relíquias de um tempo morto quando se pensava que era suficiente treinar, de forma supostamente mecânica, os alunos em duas ou três lições maçantes e inúteis. Eles descendem do filisteu original que primeiro falou sobre “Os Três R’s”;[1] e a piada sobre ele é muito simbólica de seu tipo e de seu tempo. Pois ele era um tipo de homem que insistia muito literariamente sobre o letramento, e, ainda assim, se mostrava iletrado.

Eles eram homens ricos muito iletrados que exigiam ruidosamente educação. E dentre as marcas de sua ignorância e estupidez estava uma marca particular que consistia em considerar letras e figuras como coisas mortas, muito separadas entre si e da visão geral da vida. Eles pensavam que um menino que aprendia suas primeiras letras estava muito separado de um homem de letras. Eles pensavam que um menino envolvido em seus cálculos poderia se tornar uma máquina calculadora.

Quando alguém lhes disse, portanto, “Essas coisas devem ser ensinadas numa atmosfera espiritual”, eles consideraram isso um contra-senso; tiveram uma vaga idéia de que uma criança só pudesse fazer uma simples adição se tivesse envolvida pelo aroma do incenso. Mas eles consideravam uma simples adição muito mais simples do que realmente era. Quando um polemista católico lhes disse, “Mesmo o alfabeto pode ser aprendido de uma maneira católica”, eles o consideraram um fanático delirante, pensaram que ele afirmava que ninguém nunca poderia ler algo que não fosse um missal em latim.

Mas ele acreditava no que dizia, e o que ele dizia era razoável psicologia. Há uma perspectiva católica do aprendizado do alfabeto; por exemplo, ela evita que você pense que a única coisa que importa é aprender o alfabeto; ou que você despreze pessoas melhores que você, se elas acaso não aprenderam o alfabeto.

A antiga e não-psicológica escola de instrutores costumava dizer: “Que sentido pode ter em misturar aritmética com religião?” Mas aritmética está misturada com religião ou, na pior das hipóteses, com filosofia. Faz uma enorme diferença se o professor afirma que a verdade é real, ou relativa, ou mutável, ou uma ilusão. O homem que dizia, “Dois e dois é cinco nas estrelas fixas”, estava ensinando aritmética de uma maneira anti-racional e, portanto, de uma maneira anti-católica. O católico é muito mais assertivo a respeito de verdades fixas do que de estrelas fixas.

Mas não estou agora discutindo qual filosofia é melhor; estou apenas alertando sobre o fato de que toda educação ensina uma filosofia; se não por meio de dogmas, então será por meio de sugestão, de implicação, de atmosfera. Cada parte da educação tem uma conexão como todas as outras partes. Se todas não combinam para transmitir uma visão geral da vida, não é educação em absoluto. E os modernos educadores, os modernos psicólogos, os modernos homens de ciência, todos concordam em assegurar e reassegurar isto, até que começam a discutir com os católicos sobre as escolas católicas.

Em resumo, se há uma verdade psicológica possível de ser descoberta pela razão humana, ela é esta: que, a menos que os católicos possuam e gerenciem escolas católicas, eles não terão ensino católico. Pois há um argumento contrário a que famílias católicas cresçam sendo católicas, por meio de qualquer sistema que possa ser chamado de educacional no sentido atual do termo. Há um argumento contrário a qualquer concessão aos católicos, ignorando suas idiossincrasias como se elas fossem uma insanidade. Há um argumento para isso, porque há e sempre houve um argumento a favor da perseguição; pois o estado age segundo o princípio de que certas filosofias são falsas e perigosas e devem ser esmagadas mesmo se são sinceramente seguidas; de fato, devem ser esmagadas especialmente porque são sinceramente seguidas.
Mas se os católicos forem ensinar o catolicismo todo o tempo, eles não podem meramente ensinar teologia católica parte do tempo. São nossos oponentes, não nós, que têm um ponto de vista supersticioso e escandaloso sobre a teologia dogmática. São eles que supõe que um “assunto” especial chamado teologia pode ser colocado na cabeça das pessoas por um experimento que dure meia hora; e que essa inoculação mágica durará uma semana num mundo que está inundado de uma concepção de vida contrária.

A teologia é apenas religião articulada; mas, por estranho que pareça aos verdadeiros cristãos que nos criticam, é necessário tanto ter uma religião quanto uma teologia. E religião, como estão sempre muito gentilmente a nos lembrar quando este problema particular não está em foco, é uma coisa para todos os dias da semana e não meramente para o domingo ou para as missas.

A verdade é que o mundo moderno está comprometido com duas concepções totalmente diferentes e inconsistentes de educação. Ele está sempre tentando expandir o escopo da educação; e sempre tentando excluir dela toda a religião e filosofia. Mas isso é absoluto contra-senso. Você pode ter uma educação que ensine ateísmo porque o ateísmo é verdadeiro, e esta pode ser, de seu próprio ponto de vista, uma educação completa. Mas você não pode ter uma educação alegando ensinar toda a verdade, e então recusando discutir se o ateísmo é verdadeiro.

Desde o advento de uma psicologia da educação mais ambiciosa, nossas escolas têm alegado desenvolver todos os aspectos da natureza humana; isto é, produzir um ser humano completo. Você não pode fazer isso e ignorar totalmente uma grande tradição viva, que ensina que o ser humano completo deve ser um ser humano católico ou cristão. Ou você persegue essa tradição até a sua extinção ou permite a ela construir sua própria e completa educação.

Quando o ensino consistia de soletrar, contar e construir porta-panelas e cabides, você poderia até ter razão em dizer que este ensino podia ser conduzido por um batista ou um budista. Mas que sentido tem uma educação que inclui lições de “cidadania”, por exemplo; e então fingir não incluir algo como uma teoria moral, e ignorar todos os que afirmam que uma teoria moral depende de uma teologia moral.

Os instrutores professam revelar todas as dimensões do aluno; a dimensão estética, a atlética, a política etc.; e mesmo assim eles ainda vêm com o rançoso jargão do século XIX sobre o ensino público não ter nada a ver com a dimensão religiosa. A verdade é que, nessa questão, são nossos inimigos que são antiquados e ainda permanecem na asfixiante atmosfera de uma educação não-científica e subdesenvolvida; enquanto nós estamos ao lado de todos os modernos e sérios psicólogos e educadores no reconhecimento da idéia de atmosfera. Eles às vezes preferem chamá-la de meio-ambiente.
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[1] Os três erres se referem às palavras, em inglês, relativas às supostas três habilidades básicas de uma educação orientada: reading [leitura], writing [escrita], arithmetic [aritmética]. As palavras, embora não comecem todas com “r”, tem um fonema forte que envolve esta letra. (N. do T.);

23/06/2009

Revista CP Filosofia no. 18


Saiu artigo deste blogueiro na revista de filosofia da Editora Escala, cuja capa é esta à esquerda e que já está nas bancas. O artigo é sobre G.K. Chesterton. No mesmo número saiu também uma tradução minha de um artigo de Chesterton "O Ressurgimento da Filosofia: por quê?", já publicado no blog.

21/06/2009

Nelson Rodrigues, Amoroso Lima, dom Hélder Câmara e Gustavo Corção: a tragédia da Igreja pós-conciliar vista por quem falava o que via

Reproduzo, logo abaixo, um trecho do capítulo 28 (Flor de Obsessão), do livro Anjo Pornográfico (uma biografia de Nelson Rodrigues), de Ruy Castro, editado pela Companhia das Letras, 1992.

O texto de Ruy Castro mostra Nelson Rodrigues comentando, com toda sua verve, a atuação de dois homens ligados à Igreja Católica. Por meio desses comentários, podemos perceber o início das conseqüências trágicas que o Concílio Vaticano II trouxe para a Igreja. Foi lá que se gestaram “coisas” do tipo de Pe. Marcelo ou Pe. Fábio de Melo. Foi lá que se gestaram os “freis betos” da atualidade. Foi lá que começou a se cristalizar a idéia de que Jesus Cristo teria sido um Marx avant la lettre. Amoroso Lima e dom Hélder foram para Nelson os símbolos da tragédia que viria se abater sobre nós. E ele estava certo!

Nelson também percebeu quem representava, em termos de idéias, a Igreja verdadeira. Percebeu que Gustavo Corção era o remanescente de uma intelectualidade católica que ia rapidamente desaparecer do Brasil. A frase “o verdadeiro Alceu é o Gustavo Corção” é lapidar.

Vamos ao texto. As notas são todas minhas.

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Durante todo o ano de 1968, Alceu foi personagem quase diário das “Confissões”, dividindo os holofotes apenas com dom Hélder Câmara. Alceu era colunista do Jornal do Brasil; dom Hélder, àquela altura, arcebispo de Recife e Olinda. Os dois simbolizavam para Nelson a nova Igreja Católica que “pedia perdão pelos seus dois mil anos” e que trocava a vida eterna pelo “paraíso socialista”. Alceu e dom Hélder eram também grandes favoritos entre o “Poder Jovem”, a massa de adolescentes que, de Pequim a Nova Iguaçu, acreditava sinceramente que iria dominar o mundo em 1968. Nelson abriu guerra nas três frentes: contra Alceu, dom Hélder e o “Poder Jovem”.

Ninguém poderia ter opiniões politicamente mais antipáticas numa época em que toda a “intelligentsia” brasileira parecia ter se radicalizado à esquerda. Alceu e dom Hélder, ex-integralistas e, agora, neo-socialistas, eram admirados pela coragem com que se opunham aos militares. Nelson via neles outra coisa: em Alceu, um velho oportunista tentando adular a juventude; em dom Hélder, um insaciável apetite promocional, um “globe-trotter” de si mesmo. Quanto aos jovens de 1968 (a quem Alceu atribuía a “razão da idade”, desculpando-os por qualquer besteira que fizessem), Nelson não os achava acima de críticas apenas por terem nascido em 1952.

Havia muito de pessoal nos seus ataques, mas estes tinham a ver com a sua idéia de coerência. Não conseguia entender, por exemplo, que um homem com um passado absolutamente reacionário como Alceu pudesse agora ser levado a sério ao classificar a revolução soviética como o “maior acontecimento do século”[1]. Nelson desencavou um livro de Alceu, “Indicações políticas”, de 1936, em que o mestre proclamava a sua “mais viva simpatia pelo fascismo e por toda essa moderna reação das direitas, que mostraram a não-inevitabilidade do socialismo”. Como se podia mudar de chapa com tanta simplicidade?

Nelson julgava ter a resposta: em 1936, Alceu admirava o totalitarismo de direita; em 1968, o totalitarismo de esquerda. [2] Nelson escreveu na época: “Dirão os idiotas da objetividade que [Alceu] passou da direita para a esquerda. Não é exato. Historicamente não existe mais esquerda. O que estamos vendo, com o socialismo, comunismo ou que outro nome tenha, é a direita, na sua forma mais inumana, bestial, demoníaca.”[3]

Em 1992, tal parágrafo seria endossado por muita gente, inclusive pelos batalhões de ex-marxistas.[4] Mas, em 1968, escrever isso era o mesmo que condenar-se à morte em vida. E Nelson enumerava os milhões de mortos de “fome punitiva” por Stalin, o pacto germano-soviético às vésperas da Segunda Guerra (que obrigava os comunistas brasileiros a dar vivas a Hitler por uns tempos) e os recentes intelectuais soviéticos dissidentes, internados em hospícios – para concluir que, ao contrário do que pensava Alceu, o maior acontecimento do século fora “o fracasso daquela mesma revolução”.

Essa coerência que cobrava de Alceu como se lhe mordesse os calcanhares, Nelson não exigia de si mesmo em relação ao homem que fora um de seus maiores adversários até fins de 1967: Gustavo Corção. Apenas quatro anos antes, em 1963, Nelson ainda o estava espinafrando e dizendo a seu respeito: “Um homem em que falta a metade satânica não é nada. Um santo sem nenhuma nostalgia do pecado é um monstro de circo de cavalinhos. Por exemplo: o Gustavo Corção. É uma virtude sem brecha, sem racha e se goteira”. E voltava à sua imagem dos anos 50, a de que, entre ser virtuoso como Corção e roubar galinhas, ele preferia assaltar o galinheiro mais próximo.

Mas o ano de 1967 já estava provocando uma rearrumação no tabuleiro. Corção, colaborador do “Diário de Notícias”, escreveu naquele ano que “cada vez mais admiro Nelson Rodrigues e cada vez menos Alceu Amoroso Lima”. Nelson não lia Corção havia anos e quem lhe chamou a atenção para o artigo foi o amigo comum de ambos, Luís Eduardo Borgerth.

Nelson foi ler o artigo e se deu conta de que, se queria defender uma igreja voltada para a vida intelectual, e não para a luta de classes, passara todos aqueles anos combatendo o inimigo errado. Veio-lhe o embrião de uma idéia que ele desenvolveria depois: “O verdadeiro Alceu é o Gustavo Corção”. Pediu a Borgerth que os apresentasse. Tinham passado décadas se atacando e nunca haviam trocado um olhar. (...) Os agravos e arranca-rabos passados foram esquecidos, em nome de uma profunda afinidade que agora os unia: a defesa do Céu contra as hordas de bárbaros coletivistas que o atacavam.

Quem tivesse essas idéias – e se atrevesse a trocar Alceu e dom Hélder por Gustavo Corção – deveria evitar passar pela porta do “Antonio´s”, o restaurante da avenida Bartolomeu Mitre, no Leblon, de onde, segundo Nelson, “as nossas esquerdas guardavam uma sábia distância do Vietnã”. Acontece que Nelson atrevia-se a ir eventualmente ao “Antonio´s”, porque era aonde iam seus amigos – alguns deles, também amigos de Tristão e dom Hélder.

A implicância com dom Hélder realmente começara no episódio de seu casamento com Lúcia. Mas também era verdade que dom Hélder mudara muito e sem pedir a autorização de Nelson. Poucos anos antes, por exemplo, o então bispo auxiliar do Rio era compadre de Roberto Marinho, padrinho de seu filho Roberto Irineu e fazia edificantes sermões pela rádio Globo. De repente, a partir de João XXIII, demitira-se de seu papel de “funcionário do sobrenatural” e só falava na reforma agrária e na luta armada – era louvado pela imprensa internacional com “el arzobispo de La revolución” e “Il arcivescovo rosso del Brasile”.[5]

Nelson não sabia o que mais o impressionava em dom Hélder: se o ator, a vedete, sempre atento a um microfone ou a um flash de fotógrafo – ou se o falso padre sob cuja batina ele imaginava ver os pés de cabra do anti-Cristo.

Mas Nelson não se limitava a martelar contra Alceu, dom Hélder, o “Poder Jovem”, as esquerdas do “Antonio´s” e os “marxistas de galinheiro”. Através das “Confissões”, comprava brigas também com os “padres de passeata” por atacado (tinha horror a padres sem batina, que considerava, “vestidos com um anúncio da ‘Ducal’ ”); o Jornal do Brasil (imaginava ver seu proprietário, “amarrado ao pé de mesa e lhe sendo dado de beber numa cuia de queijo Palmira”); as estudantes de psicologia da PUC; os sociólogos; as grã-finas “amantes espirituais de Guevara”; as feministas (“Todas as feministas são umas patuscas”); Jean-Paul Sartre e Bertrand Russel (“dois Acácios”); e até Alexandre Dumas filho, o de “A damas das camélias” (preferia Dumas pai, o de “Os três mosqueteiros”). Mas seu pendor polêmico se frustrava porque quase ninguém comprava de volta suas brigas. Nelson Rodrigues era um reacionário, um caso perdido ou, para outros, um palavrão.[6]

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[1] E não, por exemplo, como seria de se esperar de um católico, as aparições de Nossa Senhora em Fátima.

[2] Nelson, certamente, não leu Hayek e seu extraordinário “The Road to Serfdom”. Deste livro, da edição comemorativa dos 50 anos de sua primeira edição (The University of Chicago Press, 1994), extraio uma citação de uma frase de Mussolini: “Fomos os primeiros a afirmar que quanto mais complicadas são as formas que a civilização assume, mais restrita deve se tornar a liberdade individual”. Há um capítulo neste livro de Hayek intitulado “As raízes socialistas do Nazismo”. O pulo do fascismo para o socialismo não é só fácil como natural e, talvez, inevitável.

[3] Aqui, Nelson se equivoca, naturalmente. Pois o que ele estava vendo não era uma direita bestial, mas uma esquerda na sua forma mais natural. Quanto a esquerda não é bestial, está só disfarçando, guardando para o futuro toda a sua bestialidade.

[4] Prova cabal de que a análise de Nelson estava errada, pois, não existem ex-marxistas, como nos faz crer Ruy Castro.

[5]Ver, neste blog: Nelson Rodrigues “entrevista” D. Hélder Câmara, Nelson Rodrigues “entrevista” D. Hélder Câmara – Parte II, Nelson Rodrigues é mais católico que a CNBB .

[6] Nelson foi, em certo sentido, o Olavo de Carvalho da década de 1960. Denunciava o então Imbecil Coletivo, que viria ser definido e atacado por Olavo, com instrumentos muito mais cirúrgicos, nos anos 1990. Fizeram com Nelson o mesmo que fazem com Olavo, simplesmente ignoram suas críticas, pois não têm, e não tinham, como contrapô-las.

18/06/2009

Cor Iesu Sacratissimum





Cor Iesu sacratissimum, miserere nobis

Cor Iesu sacratissimum, miserere nobis

Cor Iesu sacratissimum, miserere nobis

15/06/2009

Tesouros de Exemplos – mais três historinhas

O gentil padre Reginaldo me avisa, por e-mail, que há sim o segundo volume do Tesouro de Exemplos, do padre Pe. Francisco Alves.

Vamos a mais três historinhas do volume I.


O CONSÔLO DE LÚCIFER

Um dia, voltando da terra, chegou um demônio ao inferno. Estava triste e abatido. Dirigindo-se a Lúcifer, o rei das trevas, disse:
- Chefe, Falhou completamente o meu esforço. Mostrei ao Filho do homem todas as riquezas e grandezas do universo e prometi-lhe dar-lhe tudo aquilo com a única condição de que me adorasse... E eis que ele me repeliu com desprezo.
- Consola-te, meu filho, responde Lúcifer, mesmo que esse esteja perdido, todos os outros nos pertencem...

Depois de algum tempo regressa o demônio de sua nova excursão pela terra e diz:
- Chefe, está tudo perdido. o Filho do homem acaba de fazer ao povo, no monte Tabor, um sermão sem igual. Ele afasta a todos das vaidades terrenas e impele-os para o reino de Deus.
- Consola-te, meu filho, diz Lúcifer, .eles gostam de ouvir palavras novas e belas, mas não as põem em prática. Esquecerão delas como se esqueceram dos ensinamentos dos profetas.

Faz o demônio outra excursão pela terra. Quando volta ao inferno, chega-se ao poderoso rei Lúcifer e, desanimado, diz:
- Meu chefe, o nosso poder está liquidado para sempre. O Filho do homem selou sua doutrina com a própria vida, provando assim que é realmente o Filho de Deus.
- Não te aflijas demais, meu filho, replicou Lúcifer, eles serão nossos, apesar de tudo. O Filho do homem provou, é verdade, por sua morte na cruz, que é o Filho de Deus, mas consola-te, meu fiel emissário, os homens não crerão Nele.

Meu irmão, tira deste imaginário diálogo uma preciosa lição para tua alma, isto é, que não deves viver como os pagãos e os libertinos, sem fé, sem religião, sem Deus.


SEMPRE MAIS

Perguntai a S. Paulo o que deveis fazer para vos tornardes semelhantes a JesusCristo. S. Paulo não vos enganará. Ele é o doutor que mais admiravelmente expõe as leis divinas de nossa perfeição na vida espiritual.

- Santo Apóstolo, temos a fé de Pedro, o discípulo escolhido por Jesus Cristo para seu vigário na terra... Basta-nos?
- Não basta.

- Temos a caridade para com Deus e o amor para próximo, que aprendemos com o discípulo predileto de Jesus. Basta?
- Não.

- Temos a fortaleza heróica demonstrada pelo Batista ante os inimigos. Basta?
- Não.

- Temos a confiança em Deus que distinguiu o patriarca S. José, o qual mereceu ser tido por pai de Jesus. Basta?
- Não basta, não... Escutai o que vos digo: Jesus Cristo é o modelo que deveis ter sempre diante dos olhos ... é o retrato que haveis de reproduzir em vosso corpo e em vossa alma. E quem era Jesus Cristo? Era a caridade, era a justiça, a mansidão, a prudência e a paciência... Era a beleza de Deus manifestando-se aos olhos humanos, para que Nele nos transformemos. Tendes, pois, de trabalhar, trabalhar muito, até que sejais retratos perfeitos desse divino Modelo...

- Mas, santo Apóstolo, nossa carne é fraca, nosso coração é louco, nossa concupiscência é animal, nossas inclinações perversas, as tentações são muitas, os demônios rodeiam-nos dia e noite, o mundo nos fascina...
- Trabalhai! E' preciso imitar a Jesus Cristo. Essa é a única segura garantia de nossa eterna salvação. Se temos a graça, temos tudo...

- Mas isso será trabalho de muitos anos.
- Tendes razão: é trabalho de toda a vida. Mas para isso é que Deus nos pôs no mundo, para isso é a vida. Se não a entendeis assim, estais tristemente equivocados...

Trabalhai! ... Tendes diante de vós uma eternidade para descansar e gozar de vossas virtudes.


PAI TODO-PODEROSO

Falava um pastor protestante com um menino que se preparava para a primeira comunhão, e perguntou-lhe:
- Você crê que na Hóstia, que vai receber, está Jesus em corpo e alma?
- Creio, sim, senhor.
- Você sabe o Pai-Nosso?
- Sei, sim, há muito tempo.
- Então, reze-o.
- Pai nosso que estais no céu. .
- Chega! Você compreende que Deus está no céu; logo, não pode estar na Hóstia.

O menino pensou um instante e disse:
- O senhor é capaz de rezar o Credo?
- Sou, sim: Creio em Deus Pai todo-poderoso...
- Basta! O sr. compreende que, sendo Deus todo-poderoso, pode fazer o que quiser, e assim pode estar no céu e ao mesmo tempo na Hóstia consagrada.

O pastor, não sabendo que responder, confundido, deu por terminado o diálogo.


Ver Quando a Vozes ainda era uma editora católica

12/06/2009

A Candeia Debaixo do Alqueire

É de se festejar que alguma editora no Brasil ainda publique livros verdadeiramente católicos. É para agradecermos a Deus que haja corajosos que doem seu tempo na tradução de livros que nos alimentem a alma. Agradeçamos pois ao tradutor da obra, Carlos Ancêde Nougué, ao Instituto Angelicum e ao Mosteiro Santa Cruz. Peçamos a Deus que lhes pague pelo bem que estão nos fazendo.

Os editores ainda nos informam que: O livro custará R$ 60,00, e desde logo aviso: os interessados em adquiri-lo devem entrar em contato conosco pelo email sidney@edsetimoselo.com.br, para reservar o seu exemplar. Na resposta aos emails (no início de junho), darei informações sobre a forma de pagamento.

Eu já reservei o meu exemplar.

PALAVRA DOS EDITORES

Aristóteles dizia que a precondição para o estabelecimento de uma verdadeira dialética é a consignação prévia de “tópicos”, ou seja: de pontos ou premissas a partir dos quais se torna possível engendrar raciocínios e deles extrair corolários. O τόπος é, literalmente, o lugar do diálogo e da confrontação das próprias idéias com as alheias e/ou contrárias. Na prática, trata-se do método científico por excelência — o que os medievais comprovaram com a sua prolífica arte da disputa (disputatio), cujo ápice se dá na obra de Santo Tomás de Aquino.

Pois muito bem: a nossa época transformou a palavra “diálogo” numa espécie de fetiche conceitual, ao fazer uso dela sem o mais remoto vestígio do rigoroso método dialético que encontramos nas obras de Sócrates, Platão, Aristóteles e, particularmente, Tomás de Aquino. Hoje — de modo inverso ao que ocorria com o τόπος aristotélico — muitas vezes as premissas, em vez de ser colocadas claramente, são retiradas para não ferir as susceptibilidades do outro “dialogante”. Com isto acaba-se por estabelecer um falso diálogo, na medida em que é varrido, para debaixo do tapete, todo e qualquer tópico presumivelmente incômodo. Um falso diálogo que, a pretexto de buscar a concórdia, deixa de lado a verdade (pois repele todas as precondições para o estabelecimento desta).

Na obra que ora apresentamos ao leitor brasileiro, o principal teólogo da Fraternidade Sacerdotal São Pio X – FSSPX na atualidade, Padre Álvaro Calderón, esgrime com o método da disputa: após enumerar, em cada artigo, uma série de objeções às teses defendidas no livro, Calderón apresenta uma resposta magistral e, depois, replica os argumentos em contrário, um a um.

Acreditamos prestar um grande serviço com a publicação no Brasil desta disputatio do Padre Calderón. Em primeiro lugar, porque a partir dela é possível divisar o cerne das questões que, desde o Concílio Vaticano II, opuseram uma parcela do Catolicismo à onda de novidades que, na prática, acarretou a mudança da liturgia da Missa, do Código de Direito Canônico e do Catecismo; e, na teoria, estabeleceu um pluralismo teológico e doutrinal cujos frutos ninguém (em sã consciência!) pode negar. Em segundo lugar, porque se estabelecem nesta obra os pontos do único diálogo com chances de ser frutuoso: o que tem como objeto formal próprio, tão-somente, a verdade — com a demarcação de todos os problemas prévios sem cuja resolução não é possível ultrapassar os limites da opinião.

O assunto deste livro é gravíssimo e as conclusões não são de molde a agradar aos paladares adocicados de um ecumenismo falsamente “dialogante”. Mas o próprio Autor, na sua Introdução, agradece de antemão a quem, por caridade, o refutar ou corrigir".

ORELHA DO LIVRO

"Dentre os carismas de que Nosso Senhor revestiu a Igreja está o da infalibilidade em questões relativas à fé e aos costumes, para que, até o final dos tempos, conserve íntegra a Verdade revelada — sustentáculo do mundo, alimento das almas, caminho de salvação. Para tanto, com sua divina autoridade (“mihi potestas in cælo et in terra”, Mt. II, 18), Cristo instituiu um Magistério universal (“euntes ergo docete omnes gentes”, Mt. XVIII, 19) sob a solidez do guiamento de Pedro (“tu es Petrus et super hanc petram ædificabo eclesiam meam, et portæ inferi non prævalebunt adversum eam”, Mt. XVI, 18), e nunca longe dele.

Prometida por Cristo, a indefectibilidade da Igreja até o fim dos tempos está, pois, intrinsecamente ligada à solidez doutrinal do ensinamento do Magistério eclesiástico. E, dada a sua fonte divina, ele não pode falhar no tocante ao precioso depósito da fé que lhe cabe guardar, assim como em relação aos costumes, cuja conformação às leis de Deus tem a Igreja como árbitra suprema, com poder de ligar e desligar (“et tibi dado claves regni cælorum et quodcumque ligaveris super terram erit ligatum in cælis et quodcumque solveris super terram erit solutum in cælis”, Mt. XVI, 19).

A este carisma do Magistério estão associados os dogmas, que são a proclamação, por parte da autoridade eclesiástica, de sentenças que expressam de maneira apropriada as verdades reveladas, afastando destas quaisquer sombras de erros ou enganos que as possam pôr em dúvida. Se a Igreja pudesse se contradizer em um só jota da sacra doutrina, isto representaria a sua ruína, daí Nosso Senhor ter advertido que passariam o céu e a terra antes que tal coisa pudesse acontecer (“vobis donec transeat cælum et terra jota unum aut unus apex non præteribit a lege donec omnia fiant”, Mt., V, 18).

Dadas estas premissas com base na Sagrada Escritura, a grave questão que a presente obra do Padre Álvaro Calderón aborda e resolve é a seguinte: considerando a onda de novidades que assolou a Igreja desde o Concílio Vaticano II — apontadas no decorrer do livro nas palavras do próprio Magistério conciliar —, que tipo e que grau de autoridade se podem atribuir a esse novo ensinamento, repleto de contradições em relação à Tradição e a todo o Magistério anterior? Para chegar à resposta, o teólogo da Fraternidade Sacerdotal São Pio X – FSSPX faz uma minuciosa exposição acerca do sujeito e do objeto do Magistério, seus órgãos autênticos e subsidiários, sua divisão segundo atos específicos e, também, os modos de infalibilidade (ordinário e extraordinário) que se dão em seu exercício.

Mas como se pode argüir de erro o Magistério da Igreja sem, com isto, infringir a norma elementar da submissão e obediência de todos os fiéis a esse mesmo Magistério? Creio que o Padre Calderón dá uma resposta definitiva a esta magna questão, fazendo uso do instrumento dialético da disputatio e trazendo à luz o ensinamento do Magistério tradicional e a palavra dos Santos Doutores.

D. Tomás de Aquino
Prior do Mosteiro da Santa Cruz (Nova Friburgo, RJ)

11/06/2009

Lições das Missas dominicais pós-Vaticano II – Adendo IV

Comento abaixo o folheto O Domingo, da Missa do Corpo e Sangue de Cristo, de 11/06/2009. Divido o comentário em quatro partes.

1. Ritos Iniciais
O texto dos Ritos Iniciais é: “Irmãos e irmãs, Cristo nos convida a fazer parte de sua família e quer nos nutrir com sua palavra e com a eucaristia. Ele se doa como alimento e como bebida para sustentar nossa caminhada rumo à convivência fraterna e solidária e à morada celeste” [Os negritos são meus].

Cristo não nos convida a nada. Ele nos admoesta, nos avisa, nos alerta, nos conscientiza, nos mostra o caminho, nos descreve a situação do ser humano, nos .... O que ele não faz é convidar!

No Evangelho da Missa Tridentina de Corpus Christi, Jesus diz: “Minha Carne é verdadeiramente comida e meu Sangue é verdadeiramente bebida. Quem come a minha Carne e bebe o meu Sangue, permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim também, o que me comer viverá por mim. Este é o pão que desceu do céu. Não como o maná que os vossos pais comeram, e contudo morreram. Quem comer deste pão, viverá eternamente.” (Jo 6, 56-59)

Estas palavras são terríveis! Pois o que elas dizem é: quem não comer da Carne Dele e não beber do Sangue Dele morrerá eternamente. Ora interpretar essas palavras como um convite é não só equivocado como terá conseqüências desastrosas. Quem salva alguém de um afogamento não o convida a sair da água! Quem resgata alguém de um incêndio não está convidando a pessoa para sair fora do prédio em chamas! Quem conduz um cego para longe do abismo, não o está convidando para um passeio vespertino num jardim maravilhoso. Quem nos convida a nos salvar do fogo do inferno não está nos convidando para um banquete de final de semana.

2. Seqüência
Reproduzi no post sobre a composição da Missa Tridentina de Corpus Christi a belíssima Sequentia composta por Santo Tomás de Aquino. Com profundo pesar leio a Seqüência da Missa Nova, composta por não sei quem. Ai! Meu Deus! Que diferença! Que pobreza! Não vou reproduzi-la aqui para não entristecer os leitores. Quem não a leu, não leia. Quem o fez, reze pela Igreja e pelo Papa.

3. O Evangelho
O Evangelho da Missa Nova é Mc 14, 12-16, 22-26. É a descrição da instituição da Eucaristia por Jesus Cristo. Vale a pena ler no folheto da CNBB: “Jesus lhes disse: ‘Isto é o meu sangue, o sangue da aliança, que é derramado em favor de muitos’ ”[negritos são meus]. Ora, dona CNBB, por que vocês não consertam as palavras da Consagração em português, como aliás já ordenou Bento XVI, de acordo com esta passagem de Marcos? Por que vocês ainda insistem em deformar as palavras de nosso Salvador, fazendo os mais desavisados crerem que o Sangue Precioso de Jesus teria sido derramado por todos, mesmos os que O rejeitam? Até quando vão enganar os fiéis com esta agenda protestantizante e modernista?

4. O texto final de Pe. Nilo Luza
Como vocês poderiam imaginar, Pe. Luza no texto intitulado “O pão da família de Deus” quer nos convencer que a Eucaristia é apenas uma refeição. É apenas alimento para o corpo. Não vou reproduzir nada deste texto aqui, pois ele não difere de outros textos que já comentei em outros posts. Vou apenas lembrar a este padre, que nos desencaminha permanentemente através de seus textos em O Domingo, as palavras do Evangelho da Missa Tridentina que já citei no item 1 acima. Jesus diz: “Este é o pão que desceu do céu. Não como o maná que os vossos pais comeram, e contudo morreram.” Ou seja, não confunda este Pão com o pão de todos os dias. Não confunda Eucaristia com refeição. Não confunda o Sacrifício do Calvário com um banquete cheio de iguarias. Pois, este pão, o maná, seus antepassados já comeram e morreram. E veja que este maná também vinha do Céu, e era dado por Deus. Este Pão é diferente, este Pão salva, este Pão nos dará a vida eterna.



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10/06/2009

Festa do Sacratíssimo Corpo de Deus: Omnes in Christo unum

Meu Missal Quotidiano Tridentino ensina o seguinte desta extraordinária festa.

A festividade do Corpo de Deus é a solene comemoração da instituição do Santíssimo Sacramento do Altar. Agradecemos e louvamos neste dia o amor de Jesus pelo dom inefável da Eucaristia. Propriamente é a Quinta-feira Santa o dia da instituição, mas a lembrança da Paixão e Morte do Salvador não permite expansões de alegria. A Santa Missa, composta pelo insigne teólogo e poeta, Santo Tomás de Aquino, é uma explicação das palavras da Seqüência – Panis vivus et vitalis – Pão vivo que dá a vida. Dela fazem parte os trechos mais importantes da Sagrada Escritura sobre a Eucaristia (Epístola e Evangelho). No Intróito, agradecemos pelo alimento do céu, a Eucaristia. Ela é para nós ‘flor de trigo’ e ‘mel do rochedo’, isto é, o Cristo, a lembrança de sua Paixão e de seu amor (Oratio). Celebrando a santa Missa, anunciamos a morte do Cristo. E sob este aspecto, a Eucaristia é um verdadeiro Sacrifício (Epístola) e alimento sobrenatural (Graduale, Evangelho), símbolo da união e paz entre os fiéis (Secreta), e penhor da união com Deus (Communio). ‘Omnes in Christo unum’, Todos somos um só (Corpo Místico) em Jesus Cristo ”.

Pois é, esta santa Missa foi composta por Santo Tomás de Aquino que “é acusado de ter tornado o estado de beatitude demasiado intelectual, concebendo-o com a satisfação do amor da verdade em vez de, especialmente, como a verdade do amor” como diz Chesterton na fenomenal biografia do santo. Assim, este santo demasiadamente intelectual compôs da Missa de Corpus Chrsti, cuja Sequentia é uma poesia nada intelectual. Vejamos o que Chesterton, na biografia citada, fala deste fato.

Toda santidade é segredo; e sua sagrada poesia era na verdade uma secreção, tal como a pérola numa ostra hermeticamente fechada. Tomás pode ter escrito mais poesia do que sabemos, mas parte dela veio a público graças à circunstância particular de lhe terem pedido para compor o ofício para a festa de Corpus Christi: um festival estabelecido primeiramente após a controvérsia para a qual ele contribuíra nos papéis que deixara no altar.[1] Isso certamente revela um lado inteiramente distinto de seu gênio, e sem dúvida era genial. Tomás costumava ser um escritor de prosa eminentemente prático, alguns diriam até um escritor de prosa bastante prosaico. Ele sustentava controvérsias voltado apenas para duas qualidades: a clareza e a cortesia. E as mantinha porque elas eram qualidades inteiramente práticas que afetavam as probabilidades da conversão. Mas o compositor do serviço de Corpus Christi não era somente aquilo que mesmo os bárbaros ou obtusos chamariam de poeta – era o que os mais tediosos chamariam de artista. Sua dupla função lembra antes a dupla atividade de alguma grande artesão da Renascença como Michelângelo ou Leonardo da Vinci, que trabalhavam na parede exterior, planejando e construindo as fortificações da cidade, e depois se retiravam para a câmara interior a fim de esculpir ou modelar algum cálice ou caixinha como um relicário. O ofício de Corpus Christi é como algum antigo instrumento musical, estranha e cuidadosamente repleto de muitas pedras e metais coloridos. O autor reuniu alguns textos remotos sobre pastorear e fruir como se colhem ervas raras: há um notável falta do estridente e óbvio na harmonia; e o todo é tocado com dois fortes versos em latim. O padre John O’Connor traduziu-os como uma competência quase milaculosa; mas um bom tradutor será o primeiro a concordar que nenhuma tradução é boa, ou, de qualquer maneira, boa o suficiente. Como vamos encontrar oito palavras inglesas curtas que de fato representem ‘Sumit unus, sumunt Mille; quantum isti, tantum ille’?[2] Como alguém de fato poderá traduzir o som do ‘Pange Lingua’, quando já a primeira sílaba ressoa como o toque de címbalos?

Vamos então à Sequetia, para conhecermos o aquinate poeta. Note que mesmo o aquinate poeta é sempre o grande mestre de sempre, nos ensinado as coisas mais elevadas. Apresento aqui a tradução de meu Missal.

Sião, louva o Salvador,
Louva o teu guia e pastor,
Nos teus hinos, nos teus cantos.

Tanto podes, tanto ouses.
Em louvá-lo não repouses:
Sempre excede o teu louvor.

Louva o tema especial:
O pão vivo, o pão vital,
Que hoje te é proposto.

O qual da ceia na mesa,
Foi dado, temos certeza,
À turba dos doze irmãos.

Seja pleno, seja forte,
Sonoro no seu transporte,
O eterno louvor da mente.

É hoje a solene festa,
Que nos recorda o que atesta
A sagrada instituição.

Na mesa do Novo Rei,
A Páscoa da nova lei
Põe um fim à fase antiga.

A sombra foge à verdade.
A velhice, à novidade,
A luz elimina a noite.

O que o Cristo faz na ceia,
Manda à turba que O rodeia
Fazê-lo em sua memória.

Herdeiros da tradição,
A hóstia da salvação,
Pão e vinho, consagramos.

Dado é um dogma ao Cristão:
Em carne se muda o pão.
O vinho se muda em sangue.

Aquilo que tu não vês,
Pela fé, que o afirma, crês,
Superando a natureza.

Sob espécies diferentes,
Sinais apenas, latentes
Se ocultam coisas exímias.

Alimento verdadeiro,
Permanece o Cristo inteiro,
Quer no vinho, quer no pão.

Não o parte que celebra,
Não o rompe quem o quebra,
Mas inteiro é recebido.

Um come. Mil comem dele.
Quanto estes, tanto ele.
Nem comido se consome.

Comungam, justo e perverso,
Mas seu destino é diverso,
Pois recebem vida e morte.

Morte do mau; do bom a vida;
Vê como a mesma comida
Produz efeitos contrários:

Se é partido o sacramento,
Não vaciles um momento:
Tanto está no fragmento,
Como no todo encerrado.

O corpo não é partido;
Só o símbolo é rompido.
Mas não é diminuído,
Nem se muda o que contém.

Eis o pão que os Anjos comem,
Transformado em pão do homem;
Os filhos o consomem:
Não seja lançado aos cães.

Em tipos prefigurado,
Foi em Issac imolado;
No Cordeiro aos pais foi dado
E, no deserto, em maná.

Bom Pastor, pão de verdade
Piedade, Jesus, piedade
Guardai-nos na caridade,
Transportai-vos à cidade,
Onde os vivos Vos contemplam.

Vós que a tudo sustentas,
Que aos homens apascentais,
Fazei a nós comensais,
Co-herdeiros imortais,
Dos santos concidadãos.

Amem. Aleluia.

Para terminar, no Evangelho (Jo 6, 56-59), Jesus nos diz: “Quem come a minha Carne e bebe o meu Sangue, permanece em mim e eu nele.”

Que Deus nos dê um bom dia de Corpus Christi.

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[1] Na mesma biografia lemos: “Quando de sua estada em Paris, os outros doutores da Sorbonne apresentaram-lhe um problema sobre a natureza da mudança mística nos elementos do Sagrado Sacramento, e ele escreveu, à sua maneira habitual, um texto muito cuidadoso e elaboradamente lúcido sobre sua própria solução. Não é preciso dizer que Tomás sentiu como extrema simplicidade a pesada responsabilidade e gravidade de semelhante decisão judicial; e, não sem naturalidade, parece ter se preocupado com isso mais do que costumava se preocupar com seu trabalho. Ele buscou orientação numa oração e numa intercessão que se prolongaram por um tempo maior do que o costumeiro; e finalmente, com um daqueles poucos mas notáveis gestos corporais que marcam as reviravoltas de sua vida, depositou sua tese aos pés do crucifixo no altar e a deixou ali, como se esperasse um julgamento. E, voltando-se, desceu os degraus do altar e mergulhou outra vez em oração; mas os outros frades, dizem, estavam observando, e ainda bem que o fizeram. Porque declararam depois que a figura de Cristo descera da cruz diante de seus olhos mortais e, de pé sobre o texto, disse: ‘Tomás, você escreveu bem quanto ao sacramento de meu corpo’. Dizem que foi depois dessa visão que aconteceu o incidente de suas milagrosa elevação no ar.”

[2] Meu Missal traduz assim: “Um come, mil comem dele; quanto estes, tanto ele”.

08/06/2009

Lições das Missas dominicais pós-Vaticano II– Parte XIX

Comento aqui o texto de Pe. Paulo Bazaglia n’O Domingo de 7 de junho de 2009, Missa da Santíssima Trindade. O título do texto é “Trindade, Comunidade de Amor”.

Uma coisinha (que é muito importante) chama a atenção no texto. Comentando o Evangelho de Mateus – onde Jesus diz: “Ide, pois, ensinai a todos os povos, e batizai-os em Nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; e ensinai-lhes a observar tudo o que vos mandei.” – Pe. Bazaglia nos diz que é a força do Espírito “que nos permite recordar e atualizar hoje o que Jesus fez e falou há 2 mil anos .” Note a palavrinha atualizar que ele usa. Vamos a ela.

Jesus ordena aos discípulos que eles ensinem aos povos a observar tudo o que Ele mandou e os batizem. Note que Jesus não diz: “Ensinem os povos, e com o passar do tempo, à medida que vocês se tornem mais espertinhos, vocês podem inclusive atualizar o que eu ensinei para vocês. Como nós estamos aqui em Israel, sob o Império Romano e somos completamente ignorantes das coisas que virão, meu ensinamento poderá, no futuro, sofrer evolução. Faça isso sobretudo depois que um sujeito chamado Karl Marx viver. Ele trará importantes atualizações à minha doutrina.”

Bem, ainda bem que Pe. Bazaglia admite francamente que é necessário atualizações no que Jesus nos ensinou. Ele nos diz que até que é o Espírito “que nos permite atualizar o que Jesus falou há dois mil anos”.

E o que seria essa atualização? Bem, através dos comentários que tenho feito ao folheto Domingo, fica muito claro o que esses padres modernistas consideram como atualização das palavras de Jesus. Atualizar Jesus é vê-lo como um marxista avant la lettre.

Um padre que ao falar da Trindade tenta nos impingir seu submarxismo de ocasião é, no mínimo, dispensável. Para não perder a viagem, vejamos o que Santo Agostinho nos tem a dizer sobre a Trindade. Tomo aqui um texto curto do santo, que escreveu um longo tratado sobre a Trindade. Tomo-o de sua obra A Doutrina Cristã, seção B, Capítulo 5, Síntese Dogmática.

O Pai, o Filho e o Espírito Santo, isto é, a própria Trindade, una e suprema realidade, é a única Coisa a ser fruída, bem comum de todos.[1] Se é que pode ser chamada Coisa e não, de preferência, a causa de todas as coisas – se também puder ser chamada causa. Não é fácil encontrar um nome que possa convir a tanta grandeza e servir para denominar de maneira adequada a Trindade. A não ser que se diga que é um só Deus, de quem, por que e para quem existem todas as coisas (Rm 11,36) Assim, o Pai, o Filho e o Espírito Santo são, cada um deles, Deus. E os três são um só Deus. Para si próprio, cada um deles é substância completa e, os três juntos, uma só substância. O Pai não é o Filho, nem o Espírito Santo. O Filho não é o Pai, nem o Espírito Santo. E o Espírito Santo não é o Pai nem o Filho. O Pai é só Pai, o Filho unicamente Filho, e o Espírito Santo unicamente Espírito Santo. Os três possuem a mesma eternidade, a mesma imutabilidade, a mesma majestade, o mesmo poder. No Pai está a unidade, no Filho está a igualdade e no Espírito Santo a harmonia entre a unidade e a igualdade. Esses três atributos são um só, por causa do Pai, todos iguais por causa do Filho e todos conexos por causa do Espírito Santo.”

Podemos ainda lembrar aqui do belíssimo Símbolo Quicumque, chamado de pseudo-atanasiano. Neste Símbolo há tudo em que se deve crer, mas há também uma extraordinária doutrina da Trindade, que é sobre o que Pe. Bazaglia nos tenta ensinar. Vamos ao Símbolo.

Quem quer salvar-se, deve antes de tudo, professor a fé católica:

Pois se alguém a não professar; integral e inviolavelmente, é certo que se perderá por toda a eternidade.

I. A fé católica consiste, porém, em venerar um só Deus na Trindade, e a Trindade na unidade, sem confundir as pessoas, nem separar a substância; Pois uma é a pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo; Mas uma é a divindade, igual a glória, co-eterna a majestade do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.

Qual o Pai, tal o Filho, tal o Espírito Santo; incriado é o Pai, incriado o Filho, incriado o Espírito Santo; imenso é o Pai, imenso o Filho, imenso o Espírito Santo; Eterno é o Pai, eterno o Filho, eterno o Espírito Santo.

E, no entanto, não há três eternos, mas um só eterno; Como não há três incriados, nem três imensos, mas um só incriado, e um só imenso; Assim também o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente; E, no entanto, não há três onipotentes, mas um só onipotente.

Como o Pai é Deus, assim o Filho é Deus, [e] o Espírito Santo é Deus; E, no entanto não há três deuses, mas um só Deus.

Como o Pai é Senhor, assim o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor; E, no entanto não há três senhores, mas um só Senhor.

Porquanto, assim como a verdade cristã nos manda confessar que cada pessoa, tomada separadamente, é Deus e Senhor; assim também nos proíbe a religião católica dizer que são três deuses ou três senhores.

II. O Pai não foi feito por ninguém, nem criado, nem gerado.

O Filho é só do Pai; não feito, não criado, mas gerado.

O Espírito Santo é do Pai e do Filho; não feito, não criado, não gerado, mas procedente.

Há, pois, um só Pai, não três Pais; um só Filho, não três Filhos; um só Espírito Santo, não três Espíritos Santos.

E nesta Trindade nada existe de anterior ou posterior, nada de maior ou menor; mas todas as três pessoas são co-eternas e iguais, umas às outras; De sorte que, em tudo, como acima ficou dite, deve ser venerada a unidade na Trindade, e a Trindade na unidade.

Quem quer, portanto, salvar-se, assim deve crer a respeito da Santíssima Trindade.

III. Mas ainda é necessário, para a eterna salvação, crer fielmente na Encarnação de Nosso Senhor Jesus Cristo.

A retidão da fé consiste, pois, em crermos e confessarmos que Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus e homem.

É Deus, porquanto gerado da substância do Pai antes dos séculos; homem, porquanto no tempo nasceu da substância de sua Mãe.

É Deus perfeito, e perfeito homem, por subsistir de alma racional e de carne humana;É igual ao Pai segundo a divindade, e menor que o Pai, segundo a humanidade.

Ainda que seja Deus e homem, todavia não há dois, mas um só Cristo; É um, não porque a Divindade se converta em carne, mas porque a humanidade foi recebida em Deus; É totalmente um, não por se confundir a substância, mas pela unidade de pessoa.

Assim como a alma racional e o corpo formam um só homem, assim Deus e homem é um só Cristo,

O qual sofreu pela nossa salvação, desceu aos infernos, ao terceiro dia ressuscitou dos mortos, e à cuja chegada todos os homens devem ressuscitar com seus corpos, para dar contas de suas próprias ações; E aqueles que tiverem praticado o bem, irão para a vida eterna; mas os que tiverem feito o mal, irão para o fogo eterno.

Esta é a fé católica, e todo aquele que a não professar, com fidelidade e firmeza, não poderá salvar-se.


Isso, condensadamente, é o que poderia nos ter ensinado o Pe. Bazaglia. Mas, suspeito, de que esse padre nunca tenha lido Santo Agostinho ou o Símbolo Quicumque. Ele parou ali no Capital de Marx e achou que isso bastava para ser católico.

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[1] Fruir, para Santo Agostinho, é “aderir a alguma coisa por amor a ela própria.” Utilizar ou usar se contrapõe a fruir, na concepção do santo, pois este termo significa “orientar o objeto de que se faz uso para obter o objeto ao qual se ama, caso tal objeto mereça ser amado.”

Para ver outros comentários sobre a Missa nova, clique: Parte I, Parte II, Parte III, Parte IV, Parte V, Parte VI, Parte VII, Parte VIII, Parte IX, Parte X, Parte XI, Parte XII, Parte XIII, Parte XIV, Parte XV, Parte XVI, Parte XVII, Adendo III, Parte XVIII

04/06/2009

Mais duas historinhas católicas: Ah! se a Vozes ainda fosse uma editora católica!

MAÇÃS E ROSAS DO CÉU

No ano de 304, no maior furor da perseguição movida por Diocleciano, u ma virgem cristã, chamada Dorotéia, foi conduzida ao tribunal do governador de Cesaréia, na Capadócia. Como não quis sacrificar aos deuses e aos ídolos pagãos, a esposa de Cristo teve de sofrer horrível martírio. Tranqüila no meio dos tormentos, disse ao juiz
- Apressa-te a fazer o que queres, e sejam os suplícios o caminho que me leve, ao celeste esposo. Amo-o e nada temo. Desejo os tormentos, pois são leves e passageiros, u ma vez que por eles chegamos às delícias do paraíso, onde há frutos e flores de maravilhosa formosura e suavidade que nunca murcham, fontes de águas vivas, onde os santos se desalteram na alegria eterna de Jesus Cristo.

Ao ouvir estas palavras o assessor do juiz, um letrado chamado Teófilo, dirigiu-se à Santa caçoando e rindo:
- Envia-me rosas e maçãs do jardim de teu esposo do paraíso quando lá chegares.
- Sim, eu as enviarei, respondeu a jovem.

Notemos que se estava em pleno inverno.

O verdugo apoderou-se da virgem e cortou-lhe a cabeça. Teófilo, chegando em casa, contou a pilhéria aos amigos entre zombarias e sarcasmos. De repente, porém, apareceu-lhe um menino de rara beleza, levando nas pregas de seu manto três magníficas maçãs e três rosas de e fragrância.
- Eis aqui, disse, o que a virgem enviou-lhe da parte de seu esposo do céu.

Teófilo, estupefato, tomou as maçãs e contemplando-as um instante, exclamou:
- Verdadeiramente, Jesus Cristo é Deus, o Deus que não engana.

Fazendo esta confissão, Teófilo selava a sua sentença de morte. Algumas horas depois, conduziram-no ao suplício, tornando-se mártir da mesma fé católica de que antes zombara.


HEROÍSMO DE UM ANCIÃO

S. Policarpo, um dos grandes heróis da Igreja Católica, era bispo de Esmirna e discípulo de S. João Evangelista. Foi um dia detido por um piquete de soldados, os quais recebeu e tratou com muita caridade, convidando-os a se assentarem à sua mesa para a ceia.

Pediu-lhes depois lhe dessem tempo para encomendar a Deus, a Igreja e seus perseguidores. Feita a sua oração, pôs-se a caminho com os soldados, que o maltrataram cruelmente durante toda a viagem, pagando com violências os benefícios que lhes fizera o santo bispo.

Conduzido à presença do governador, quis este convencê-lo que era melhor sacrificar aos deuses e salvar a vida do que deixar-se martirizar. Falou-lhe assim:
- Venerável ancião, amaldiçoa a Cristo e eu te porei em liberdade.
- Faz oitenta anos que sirvo a Jesus Cristo e dele só tenho recebido favores e benefícios; por que, pois, haveria de amaldiçoá-lo?
- Se as feras não te dilacerarem, insistiu o governado - serás queimado vivo.
- Bem se vê que desconheceis o fogo eterno do inferno, e por isso me ameaça com o tormento do fogo terreno e passageiro.

Condenado à fogueira, o fogo, em vez de queimá-lo, formou uma como grinalda ao redor dele, não lhe causando o menor dano.

Atravessaram-no então com a espada e, assim, terminou gloriosamente a sua vida terrena o heróico confessor de Jesus Cristo e defensor intemerato da Santa Igreja.

Ver Quando a Vozes ainda era uma editora católica

03/06/2009

Quando a Vozes ainda era uma editora católica

Caiu em minhas mãos um livro extraordinário. Intitula-se Tesouro de Exemplos (volume I) e seu autor é Pe. Francisco Alves. Foi publicado pela Vozes em 1958.

Pe. Francisco diz que “o propósito deste livro é oferecer a todos que têm a obrigação de educar a infância e a juventude um variado repertório de fatos verídicos ou verossímeis que, contados, movam seus ouvintes a julgar sãmente do seu valor moral e, por conseguinte, os disponham, à luz desses exemplos, a praticar o bem e evitar o mal.”

E os fatos narrados são extraordinários. Neste primeiro volume (não sei se há outros volumes) há 407 historinhas fabulosas. Apresento abaixo duas delas para o leitor ter uma idéia do conteúdo do livro.

Quem se interessar em fazer o downloado do livro clique aqui.


QUERO IR AONDE ESTÁ JESUS

Um pastor protestante, inclinado já ao catolicismo, foi um dia com sua filhinha em visita à capital da Inglaterra. A menina contava apenas cinco anos.

O pai levou-a primeiro a uma igreja católica e a atenção da pequena ficou muito tempo prêsa à lâmpada do Santíssimo.
- Papai, - disse - para que aquela lâmpadazinha?
- Filha, é para lembrar a presença de Jesus atrás daquela portinha dourada.
- Papai, eu quero ver Jesus!
- Filha, a porta está trancada e Ele está escondido debaixo de um véu, não o poderás ver.
- Ah! papai, quanto eu quisera ver Jesus! . . .

Saindo dali, entraram logo depois num templo protestante, onde não havia nem imagens, nem lâmpada nem sacrário.
- Papai, por que não há lâmpada aqui?
- Filhinha, é porque aqui não está Jesus.

Desde aquele dia a menina só falava na Igreja Católica. Nunca mais quis entrar num templo protestante, que para ela não tinha já nenhum atrativo. Perguntaram-lhe:
- Aonde queres ir, então?
- Quero ir aonde está Jesus.

O pastor ficou confundido e comovido. Compreendeu, como sua filha, que só se pode estar bem onde está Jesus. Havia de fazer-se católico, havia de abjurar sua seita e renunciar a uma renda de cem mil libras, de que vivia a sua família, e ver-se pobre de um dia para o outro.

Não obstante, pai e mãe se converteram ao catolicismo, dizendo com sua filha: "Queremos estar onde está Jesus"

O MEDO DO COROINHA

S. Pedro, chamado de Alcântara, pelo lugar onde nasceu (1499), entrou na Ordem dos Franciscanos com a idade de 16 anos. Foi um dos santos mais penitentes e favorecidos de Deus em seu tempo. S. Teresa de Ávila, que o conhecia de perto, conta-nos que S. Pedro passara 40 anos sem dormir mais de hora e meia por dia. O Santo não se deitava, mas ficava assentado com a cabeça encostada a um pau da parede. Essa foi a penitência
que mais sacrifícios lhe custou.Além disso, usava horríveis cilícios, passava às vezes três dias, e até oito, sem outro alimento que a Sagrada Comunhão. Em vista de tudo isso, não é de estranhar que se tenha elevado à mais alta contemplação, e Jesus o tenha favorecido com inefáveis carícias, mormente na missa e na sagrada comunhão.

Conta-se que, em certo convento, o coroinha, que ajudava na missa do Santo, era um menino inocente e bonzinho. Um dia, ao regressar a igreja, procurou o menino a sua mãe e disse-lhe:
- Mamãe, eu não quero mais ajudar à missa do Padre Pedro.
- Por que, meu filho, não hás de ajudar o Padre Pedro, que é um padre tão santo?
- Mamãe, ao ajudar-lhe a missa, várias vezes tenho visto um menino lindo, muito lindo, nas mãos dele; e, na hora da comunhão, ele come aquele menino. Mamãe, tenho medo que ele me coma também.

A mãe, que conhecia a santidade do Padre Pedro, compreendeu logo o mistério e disse:
- Não temas, meu filho; é o Menino Jesus que está na Hóstia . Que feliz és tu, que o vês com teus olhos inocentes!

Dali em diante o menino não teve mais medo e ajudava à missa do Santo com muito gosto e devoção.