27/04/2012

Purgatório: Primeira visão - Purgatório é similar ao Inferno


Pe. Faber

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A primeira visão é corporificada nos aterradores sermões dos quaresmali[1] italianos e naquelas pinturas populares que se vê em casas à beira das estradas, que tanto enfastiam os viajantes ingleses. Elas não cansam de representar o Purgatório como um inferno que não é eterno. Violência, confusão, gemidos e horrores pairam sobre suas descrições. Insistem, com justeza, na terrível pena dos sentidos, que misteriosamente acomete a alma. O fogo é o mesmo fogo do Inferno, criado com o único e expresso fim de torturar. Nosso fogo terreno assemelha-se, em comparação, a um fogo pintado. Além disso, há um horror especial e indefinível que recaí sobre a alma desencarnada ao se tornar presa dessa agonia material. O sentimento de aprisionamento, íntimo e intolerável, e a escuridão intensamente palpável são características adicionais ao horror da cena, que nos prepara para aquela vizinhança do Inferno, expressão usada por muitos santos para descrever o Purgatório. Os anjos aparecem como ativos executores da terrível justiça de Deus. Alguns afirmaram até que os demônios têm permissão de tocar e atormentar as esposas de Cristo naqueles fogos ardentes.

Então, a essas terríveis penas de sentido se ajunta a apavorante pena de dano. A beleza de Deus permanece o mesmo objeto imensamente desejável com sempre foi. Mas a alma muda. Tudo que na vida e no mundo dos sentidos entorpecia seus desejos de Deus não existe mais, de modo que ela O procura com uma impetuosidade que nenhuma imaginação pode em absoluto conceber. Seu excessivo e ardente amor torna-se a medida de sua dor intolerável. O que o amor pode fazer mesmo aqui na terra pode ser compreendido pelo exemplo de Pe. João Batista Sanchez, que dizia que seguramente morreria de miséria se ao acordar tivesse certeza de que não morreria naquele dia. A esses horrores podemos adicionar muitos mais, que representam o Purgatório como um inferno que apenas não dura para sempre.

O santo temor de ofender a Deus

O espírito dessa visão é um santo temor de ofender a Deus, um desejo por austeridades corporais, uma grande consideração para com as indulgências, um extremo horror do pecado e um tremor habitual ante a consideração do julgamento de Deus. Os que viveram sob penitências incomuns, e em Ordens religiosas severas, sempre foram impregnados dessa visão; e parece terem sido confirmados, nos mínimos detalhes, pelas conclusões dos teólogos escolásticos, como pode ser visto de imediato ao se consultar Berlarmino, que, em cada seção de seu tratado sobre o Purgatório, compara as revelações dos santos com as consequências da teologia. É notável também que quando o Beato Henrique de Suso, por meio de crescente familiaridade e amor a Deus, começou a considerar leves, comparativamente, as dores do Purgatório, Nosso Senhor o alertou que isso muito O desagradava. Pois, como considerar leve um castigo que Deus preparou para o pecado? Muitos teólogos dizem que não só a menor pena do Purgatório é maior do que a maior pena na terra, mas maior do que todas as penas terrenas juntas.

Esta é uma visão verdadeira do Purgatório, mas não uma visão completa. Mesmo assim, não é uma visão que possa ser considerada grosseira ou grotesca. É a visão de muitos santos e servos de Deus, e predomina nas celebrações do Dia de Finados em diversos países católicos.




[1] Pregadores da época da quaresma. (N. do T.)

4 comentários:

Anônimo disse...

Caro professor Angueth,

tenho uma dúvida que me atormenta a algum tempo e nada tem a ver com o presente post. Já enviei um e-mail ao professor Olavo de Carvalho e não obtive resposta. O caso é o seguinte: O professor sugeriu em uma das primeiras aulas do COF, como exercício, amar tudo e todos. Eu entendo que amar se traduz pela ação caridosa. Nesse ponto reside minha dúvida: como funcionário do Metrô de São Paulo, sou abordado diversas vezes ao dia por pessoas que querem passar sem pagar a passagem; algumas vezes, porque sinto que muitos desses pedintes têm reais dificuldades para pagar suas passagens, eu os passo; outras vezes, eu os passo porque não quero discutir com os pedintes (situação muito comum quando um pedinte tem seu pedido negado). O problema é que a Empresa não permite que pessoas que não pagam viajem e os chefes vigiam para que isso não aconteça. Eu passo os pedintes sabendo que estou desrespeitando a chefia e as ordens da Empresa que paga meu salário. Agora que me propus a realizar o exercício proposto pelo professor Olavo, como devo agir? Se eu recusar todos os pedidos que me fazem diariamente, estarei agindo de acordo com as normas da Companhia, mas confesso que me corta o coração quando não posso algumas pessoas que sinto não terem condições de pagar. Por outro, lado se passo desobedeço a Empresa e arrisco sofrer punições. Como devo agir?

Um abraço.

Alexandre.

Antônio Emílio Angueth de Araújo disse...

Caro Alexandre,

Não sei se você é católico. Se for você deve saber que:
- amar ao próximo é diferente de gostar do próximo. Os católicos somos obrigados a amar nossos inimigos, mas não a gostar deles;
- amamos ao próximo porque amamos a Deus e Deus criou tanto a mim quanto a meu próximo e nos ama igualmente.

Nosso Senhor nos deu o mandamento do amor ao próximo, para que expressássemos o amor a Ele de forma sensível e não de forma abstrata. Nessa expressão, Ele nos comanda que usemos de nossos bens, tanto intelectuais quanto corporais para ajudar nosso próximo. Veja que Ele não nos ordena que usemos de bens alheios para ajudar nosso próximo. Está claramente errado usar um bem público que você deve guardar, para ajudar a quem quer que seja. Isso é pecado. Muito antes de temer punições de sua empresa, tema as punições que virão de Deus.

Se você quer ajudar o pobre que não pode pagar transporte público, pague a passagem dele com o dinheiro de seu bolso.

Ad Iesum per Mariam.

Anônimo disse...

Prezado prof.Angueth, tenho uma dúvida acerca do tema: se haverá o juízo final, por que algumas almas são lançadas no inferno? Não deveria haver um "grande purgatório" para comportar todas as almas até o juízo e, só então, lançar os condenados ao inferno? Outra dúvida, se me permite, foi um argumento que li tempos atrás num livro espírita: como poderia uma mãe gozar verdadeiramente o céu sabendo que o filho que ama arde eternamente no inferno? Agradeço desde já sua atenção. Deus o abençoe. Roberto.

Antônio Emílio Angueth de Araújo disse...

Caro Roberto,

Veja sua resposta aqui.